A instalação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça)
em 2005 sinalizou profundas mudanças no Judiciário, até
então apontado como o mais hermético e resistente a
mudanças entre os três poderes. Foram instituídas
05 normas para proibir o nepotismo nos tribunais e regras
para a aplicação do teto remuneratório para coibir os
supersalários que recorrentemente escandalizavam a
opinião pública.
A correção dos desvios refletiu nova atitude dos
10 magistrados, mais aberta ao diálogo com a sociedade e
mais propensa a assimilar construtivamente críticas em
relação aos serviços judiciais. Pôs-se fim ao clichê do juiz
encastelado em torre de marfim, distante da sociedade.
Tal atitude implicou a busca de maior transparência.
15 Era preciso assegurar ao cidadão amplo acesso a
informações sobre o desempenho da Justiça. Essas
informações, lamentavelmente, não existiam ou eram
imprecisas e defasadas. O Judiciário, na verdade, não se
conhecia.
20 Nesse contexto, a Corregedoria Nacional de Justiça
lançou em 2007 o programa Justiça Aberta, um banco de
dados com informações na internet (www.cnj.jus.br)
atualizadas continuamente, que permite o
monitoramento da produtividade judicial pelo próprio
25 Poder Judiciário e pela sociedade. É a prestação de
contas que faltava.
Esse autoconhecimento é o ponto de partida para
que o Judiciário dê continuidade a mudanças que se
reflitam, efetivamente, na qualidade da prestação
30 jurisdicional, que, sabemos, é alvo de insatisfação por
parte dos jurisdicionados. A principal das reclamações é
a morosidade, muitas vezes associada à impunidade ou
não-efetivação da Justiça. Mais de 50% das
representações que chegam ao CNJ referem-se a esse
35 problema.
É um problema que atinge desde a primeira instância
até os tribunais superiores. Nascido na Constituinte que
ampliou os direitos e as garantias do cidadão, o STJ
(Superior Tribunal de Justiça) completará 20 anos no dia
40 7/4 do ano que vem, com aumento de 8.920% no
número de processos julgados. No primeiro ano de
funcionamento, julgou 3.700 processos. Em 2007, 330
mil processos.
A progressão geométrica da demanda compromete
45 não só a celeridade, mas a própria missão constitucional
do STJ, que é a de uniformizar a interpretação das leis
federais.
Chegou-se ao paradoxo em que, por julgar número
excessivo de processos, a construção da jurisprudência,
50 que é seu papel maior, ficou em segundo plano. Com
uma média anual de 10 mil processos julgados por cada
ministro, o complexo ato de julgar corre o risco de se
transformar em mero ato mecânico.
Atacar esse mal implica a adoção de um conjunto de
55 ações e iniciativas. A busca da gestão eficiente,
certamente, é uma delas. A emenda constitucional 19, de
1998, forneceu importante meio de a sociedade exigir a
qualidade dos serviços prestados pelo Estado, ao
introduzir a eficiência como um dos princípios da
60 administração pública. Diagnósticos precisos,
planejamento, profissionalismo, soluções criativas,
racionalização, enfim, todos os requisitos de uma gestão
moderna não são, portanto, apenas desejáveis, mas
indispensáveis.
65 Se a Constituinte de 1988 deu ênfase à segurança
jurídica, particularmente à garantia do contraditório e da
ampla defesa, em detrimento da celeridade processual, o
que se observa hoje é o clamor da sociedade por uma
Justiça mais rápida. A emenda constitucional 45, da
70 reforma do Judiciário, refletiu esse anseio ao inserir entre
os direitos fundamentais a razoável duração do processo
e os meios que garantam a celeridade da tramitação. É
difícil conciliar esses dois princípios antagônicos:
celeridade x segurança.
75 A demanda por transparência e por celeridade
processual exige uma Justiça de qualidade. Esta deve ser
buscada não apenas com uma ou duas ações, mas, sim,
com múltiplas iniciativas, que passam pela busca de uma
gestão mais eficiente, com o aproveitamento racional
80 dos recursos, a capacitação de magistrados e servidores
e a racionalização de procedimentos, por avanços na
informatização do processo, de acordo com os
procedimentos previstos na Lei 11.419/06, pela reforma
processual e por tantas outras medidas.
85 Esse é um desafio a ser enfrentado não apenas pelos
dirigentes do Judiciário, mas por todos os partícipes da
atividade judicial, sejam eles magistrados, membros do
Ministério Público, advogados, servidores, promotores.
Somente com a mobilização de todos esses atores é que
90 o Judiciário poderá atender à exigência da sociedade de
uma Justiça de qualidade, efetiva e em tempo razoável.
(Cesar Asfor Rocha. Folha de São Paulo, 8 de setembro de 2008.)
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