– É bom mesmo o cafezinho daqui, meu amigo? – Sei dizer não senhor: não tomo café. – Você é dono do café, não sabe dizer? – Ninguém tem reclamado dele não senhor. – Então me dá café com leite, pão e manteiga. – Café com leite só se for sem leite. – Não tem leite? – Hoje, não senhor. – Por que hoje não? – Porque hoje o leiteiro não veio. – Ontem ele veio? – Ontem não. – Quando é que ele vem? – Tem dia certo não senhor. Às vezes vem, às vezes não vem. Só que no dia que devia vir em geral não vem. – Mas ali fora está escrito “leiteria”! – Ah, isso está, sim senhor. – Quando é que tem leite? – Quando o leiteiro vem. – Tem ali um sujeito comendo coalhada. É feita de quê? – O quê: coalhada? Então o senhor não sabe de que é feita a coalhada? – Está bem, você ganhou. Me traz um café com leite sem leite. Escuta uma coisa: como é que vai indo a política aqui na sua cidade? – Sei dizer não senhor: eu não sou daqui. – E há quanto tempo o senhor mora aqui? – Vai para uns quinze anos. Isto é, não posso agarantir com certeza: um pouco mais, um pouco menos. – Já dava para saber como vai indo a situação, não acha? – Ah, o senhor fala da situação? Dizem que vai bem. – Para que partido? – Para todos os partidos, parece. – Eu gostaria de saber quem é que vai ganhar a eleição aqui. – Eu também gostaria. Uns falam que é um, outros falam que outro. Nessa mexida... – E o prefeito? – Que é que tem o prefeito? – Que tal o Prefeito daqui? – O prefeito? É tal e qual eles falam dele. – Que é que falam dele? – Dele? Uai, esse trem todo que falam de tudo quanto é prefeito. – Você, certamente, já tem candidato. – Quem, eu? Estou esperando as plataformas. – Mas tem ali o retrato de um candidato dependurado na parede, que história é essa? – Aonde, ali? Uê, gente: penduraram isso aí...
(Texto extraído do livro A Mulher do Vizinho, Editora Sabiá – Rio de Janeiro, 1962, pág. 144)
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