O lado certo
RIO DE JANEIRO – Tanto no Congresso como na mídia está em discussão uma legislação que possa punir os abusos (ou os crimes) praticados na ou pela internet. A nudez da atriz Scarlett Johansson está sendo considerada uma invasão da privacidade a que todos temos direito. E há casos mais escabrosos, como acessos a contas bancárias, pornografia infantil etc. Pergunta: uma lei resolverá o problema?
Tenho minhas dúvidas. Existem leis para tudo e para todos, elas dependem não apenas da fiscalização policial ou judicial, mas da interpretação que damos a elas. Já citei, há tempos, o caso de Gulliver, personagem da obra-prima de Jonathan Swift, e o cito de novo porque o assunto continua atual.
Náufrago, Gulliver caiu numa terra de anões belicosos, os liliputianos, que o tornaram prisioneiro e que mantinham uma guerra de 800 anos com anões de outra região. Devido a seu tamanho, foi obrigado a lutar por um dos lados, e vendo tantas barbaridades, perguntou ao rei, a quem era obrigado a servir, o motivo de luta tão feroz e selvagem.
O rei explicou que o povo dele, ao tomar o café da manhã, cortava os ovos pela parte de cima, a mais pontiaguda, e os inimigos cortavam os ovos pela parte de baixo, a mais arredondada. Gulliver ouviu, pensou, pensou outra vez e perguntou ao rei se não havia uma lei, um decreto, uma legislação que determinasse a questão, estabelecendo de uma vez para sempre a maneira de todos cortarem os ovos.
O rei ficou espantado e respondeu: "Somos civilizados. Evidente que há uma lei que regulamenta o assunto". Gulliver quis saber o que a tal lei dizia e o rei, em tom solene, majestático, informou: "O primeiro artigo de nossa Constituição diz claramente que os ovos devem ser cortados pelo lado certo".
Carlos Heitor Cony. Folha de S.Paulo, 20 set. 2011
Casos recentes de violação de privacidade servem de alerta
A invasão de hackers ao sistema de jogos on-line da Sony pode ter comprometido dados pessoais de 100 milhões de usuários.
Os consumidores pouco hesitam para revelar grande volume de informações pessoais. No entanto, os esforços de proteção a esses dados não cresceram de maneira compatível. As pessoas muitas vezes usam a mesma senha para muitas contas.
Os consumidores não protegem suas identidades online, e as empresas têm forte incentivo comercial para recolher o máximo possível de informações.
O advento das redes sociais tornou essa tendência ainda mais preocupante. As companhias querem encorajar usuários a compartilhar informações, e por isso o esquema de proteção de dados não é muito propício em termos de privacidade. Isso cria vulnerabilidades.
As companhias têm interesse em tratar com seriedade a segurança. Os efeitos de uma violação de privacidade sobre a reputação de uma companhia podem ser severos, como a Sony descobriu.
Mas também existe interesse público em jogo, dada a extensão da troca de informações e das transações conduzidas nas redes sociais.
É preciso que existam regras mais claras quanto à propriedade dessas informações. O mais importante é que precisa ser mais fácil para os usuários remover essas informações da internet.
Não há nada de errado em que usuários troquem informações pessoais por serviços, mas eles precisam saber que é isso que estão fazendo e compreender as consequências caso algo de errado aconteça.
Do "Financial Times". Folha de S.Paulo, 04 mai. 2011
Nesses textos, há referência aos rumos que o uso da internet tomou neste século. O que há em comum nos dois textos é a menção explícita
a)
à viagem de Gulliver. |
b)
à invasão de hackers ao sistema de jogos on-line. |
c)
à privacidade invadida. |
d)
aos casos de pornografia infantil. |
e)
à nudez da atriz divulgada na rede. |
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