O acentuado crescimento da violência no Brasil, todos sabe-
mos, tem como causa uma série de determinantes institucionais
e fatores sociais, seja porque o Estado vem sendo omisso na sua
tarefa de prevenir e reprimir o crime e na missão de oferecer po-
5 líticas sociais voltadas para o bem-estar de todos, seja porque a
própria sociedade não vem contribuindo para a sua diminuição e
reprovação. Os crimes cometidos mais cotidianamente em todos
os recantos do País, nos pequenos e grandes centros urbanos e
na zona rural, violam o patrimônio alheio (68%), significando dizer,
10 por isso, que o desemprego caminha lado a lado com o roubo, o
furto, a apropriação indébita, o estelionato e a extorsão mediante
sequestro. São pessoas que ingressam na criminalidade, quantas
vezes, pela falta de oportunidade de emprego, em geral homens
e mulheres responsáveis pela criação de filhos que vieram ao
15 mundo sem qualquer controle de natalidade, outra função estatal
reconhecidamente desprezada. Sem perspectivas de sustentar
a família com os ganhos de um trabalho honesto e gratificante -
numa sociedade em que todos podem adquirir uma arma de fogo
livremente - fica muito mais fácil cometer ilícitos penais. A ausência
20 de políticas sociais (emprego, moradia, saúde, educação, princi-
palmente), com certeza, tem corroborado concretamente com o
aumento da criminalidade.
Cumpre assinalar, por outro lado, que esse mesmo Estado
há muito vem fracassando na sua árdua missão de evitar e de
25 combater o crime, posto que sejam reconhecidamente inoperantes
as políticas de segurança pública e o aparelhamento de repressão
ao delito. Se, de um lado, constatamos uma polícia ostensiva e
judiciária completamente desmotivada, despreparada e ineficaz, a
quem compete investigar e evitar o crime, por outra via vivenciamos
30 um Ministério Público, autor da ação penal e guardião dos direitos
difusos, absolutamente relegado a segundo plano, no momento em
que quase sempre lhe é negado o seu fortalecimento institucional,
por ocasião da fixação da sua dotação orçamentária. Estamos num
País em que o Judiciário, responsável número um pela distribuição
35 de justiça e verdadeiro sustentáculo da democracia, só é Poder
no momento de ser cobrado, o que acontece insistentemente. Pouco
se fala em seu soerguimento ou na sua modernização. Uma polícia
que não previne e não investiga a contento o crime, um Ministério
Público e um Judiciário reconhecidamente sucateados e inertes
40 frente a uma criminalidade crescente e cada vez mais organizada,
necessariamente também dão causa à evolução do crime.
A própria sociedade - responsável solidária pela segurança pú-
blica (art. 144, CF/88) - quase nada tem feito em benefício de uma
paz social duradoura, no momento em que, chamada a participar
45 da prova indiciária ou processual, costumeiramente se esquiva em
denunciar os verdadeiros culpados e a depor nos inquéritos policiais
e em processos criminais instaurados com a função de apurar a
responsabilidade criminal dos eventuais culpados.
Ouvi de um juiz de Direito, recentemente, a seguinte expres-
50 são: muitas pessoas estão preferindo ser presas, pois só assim
terão acesso à comida e moradia. É forçoso reconhecer que razão
assiste ao magistrado. Embora a liberdade seja um dos mais im-
portantes de todos os direitos e garantias individuais assegurados
aos brasileiros pela Constituição, infelizmente, muitos famintos e
55 excluídos socialmente preferem ser custodiados pelo Estado a
viver em liberdade, em troca de comida e de moradia. A injustiça
social, portanto, tem contribuído para o atual quadro de violência e
de desumanidade, ao tempo em que tem transformado a liberdade
de ir e vir numa utopia para os excluídos da sociedade.
Adaptado de Adeíldo Nunes. In: www.paranaonline.com.br/direitoejustiça
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