1 Passando pela porta de um colégio, me veio 2 a sensação nítida de que aquilo era a porta da 3 própria vida. Banal, direis. Mas a sensação era 4 tocante. Por isso, parei, como se precisasse ver 5 melhor o que via e previa. 6 Primeiro há uma diferença de clima entre 7 aquele bando de adolescentes espalhados pela 8 calçada, sentados sobre carros, em torno de 9 carrocinhas de doces e refrigerantes, e aqueles 10 que transitam pela rua. Não é só o uniforme. 11 Não é só a idade. É toda uma atmosfera, como 12 se estivessem ainda dentro de uma redoma ou 13 aquário, numa bolha, resguardados do mundo. 14 Talvez não estejam. Vários já sofreram a 15 pancada da separação dos pais. Aprenderam 16 que a vida é também um exercício de 17 separação. Um ou outro já transou droga, e 18 com isso deve ter se sentido 19 (equivocadamente) muito adulto. Mas há uma 20 sensação de pureza angelical misturada com 21 palpitação sexual, que se exibe nos gestos 22 sedutores dos adolescentes. 23 Onde estarão esses meninos e meninas 24 dentro de dez ou vinte anos? 25 Aquele ali, moreno, de cabelos longos 26 corridos, que parece gostar de esporte, vai se 27 interessar pela informática ou economia; 28 aquela de cabelos louros e crespos vai ser dona 29 de boutique; aquela morena de cabelos lisos 30 quer ser médica; a gorduchinha vai acabar 31 casando com um gerente de multinacional; 32 aquela esguia, meio bailarina, achará um 33 diplomata. Algumas estudarão Letras, se 34 casarão, largarão tudo e passarão parte do dia 35 levando filhos à praia e à praça e pegando-os 36 de novo à tardinha no colégio. [...] 37 Estou olhando aquele bando de adolescentes 38 com evidente ternura. Pudesse passava a mão 39 nos seus cabelos e contava-lhes as últimas 40 histórias da carochinha antes que o lobo feroz 41 as assaltasse na esquina. Pudesse lhes diria 42 daqui: aproveitem enquanto estão no aquário e 43 na redoma, enquanto estão na porta da vida e 44 do colégio. O destino também passa por aí. E a 45 gente pode às vezes modificá-lo.
SANT’ANNA, Affonso Romano de. Affonso Romano de Sant’Anna: seleção e
prefácio de Letícia Malard. Coleção Melhores Crônicas. p. 64-66.
Marque com V o que for verdadeiro e com F o que for falso, em relação à crônica “Porta de colégio”.
( ) O cronista introduz a ideia núcleo do texto logo nas três primeiras linhas e o faz por meio de uma analogia.
( ) No quarto parágrafo, o enunciador responde à pergunta retórica feita no terceiro, empregando o advérbio interrogativo onde. As respostas, no entanto, não correspondem às respostas que se dariam a uma pergunta feita com o advérbio onde. Na pergunta correspondente a essas respostas, deveria constar algo como “Que acontecerá” ou “Como estarão”, não onde.
( ) O vocábulo clima (linha 6) e o vocábulo atmosfera (linha 11) não poderiam intercambiar suas ocorrências no texto sem prejuízo do sentido.
( ) No parágrafo 5 (linhas 37-45), o cronista faz alusão a um conto infantil, para mostrar como os adolescentes só têm segurança dentro da escola.
( ) Os assaltos do “lobo feroz” (linha 40), corresponderiam, no mundo moderno, ao estupro, ao latrocínio, ao homicídio, ao tráfico de crianças e de mulheres, à venda de drogas, em suma, aos perigos da vida moderna.
Está correta a seguinte sequência de cima para baixo:
a)
V, V, F, F, V. |
b)
V, F, V, V, F. |
c)
V, V, V, F, V. |
d)
F, V, F, V, V. |
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