1 Devemos começar por isolar as perguntas sobre conceitos das outras perguntas. Só raramente encontra- 2 se uma pergunta sobre conceitos apresentada em forma pura. É possível, mas improvável, que alguém nos 3 faça uma pergunta como “Qual é a natureza lógica do conceito de punição?” Quase sempre o que se 4 encontra são perguntas mais confusas e complexas, como, por exemplo: “Devem-se punir as pessoas 5 internadas em hospitais psiquiátricos?” Nesse caso, a pergunta, por assim dizer, nos convida a participar de 6 diversos jogos diferentes. Para responder plenamente à pergunta, é necessário: (i) analisar o conceito de 7 punição; (ii) ter algum conhecimento concreto do tipo de pessoa que realmente está internada nesses 8 hospitais; e (iii) expressar algum tipo de opinião moral sobre se tais pessoas devem ou não receber punição. 9 Em outras palavras, esta é uma pergunta mista, que envolve não só a análise conceitual, mas também 10 considerações sobre fatos e sobre juízos de valor. 11 Para examinar outros exemplos, tomemos primeiro a pergunta: “A liberdade é importante para um 12 indivíduo em sociedade?” Aqui temos uma pergunta para a qual se exige tanto uma análise conceitual 13 quanto um juízo de valor. Precisamos (i) analisar o conceito de liberdade e (ii) expressar uma opinião sobre 14 a importância e o valor do conceito. Outra pergunta: “O progresso é inevitável no século XX?” Nesse caso, 15 estão envolvidas análise conceitual e considerações sobre fatos. Precisamos levar em conta o conceito de 16 progresso (e talvez também o conceito de inevitabilidade), para então examinar os fatos relacionados ao 17 século XX que consideramos relevantes. 18 Não faz parte do nosso objetivo considerar o modo como se devem responder a questões sobre juízos 19 de valor ou sobre fatos. Mas é claro que não responderemos muito bem a nenhuma pergunta (e tampouco, 20 seguramente, às perguntas sobre conceitos) se não fizermos uma distinção muito nítida entre os tipos 21 lógicos de indagação que podem estar ocultos dentro do que parece ser uma única pergunta. Há apenas um 22 ponto de interrogação, mas diversas perguntas. E não poderemos fazer justiça a nenhuma delas enquanto 23 não tivermos tratado cada uma individualmente. Num dos exemplos citados, é óbvio que não poderemos 24 nem começar a dizer quem deve ser punido enquanto não soubermos com clareza o que é a punição. Sem 25 saber isto, não teremos certeza (num sentido perfeitamente literal) do que estamos falando. Temos de 26 entender a liberdade antes de poder expressar qualquer opinião inteligente sobre a importância da 27 liberdade. E temos de entender o progresso para poder saber se é inevitável. Devemos, portanto, isolar as 28 questões sobre conceitos e tomá-las como prioritárias.
WILSON, John. Pensar com conceitos. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 22-24.
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