A respeito de direitos da personalidade, pessoas jurídicas e personalidade, julgue o item a seguir, de acordo com a jurisprudência do STJ.
Caso determinada rede de rádio, por informações veiculadas em sua programação, atinja a honra e a imagem do próprio Estado, será admitida, nessa hipótese, ação indenizatória por dano moral pelo ente federativo em desfavor da empresa de radiodifusão, devendo o locutor responder regressivamente se tiver agido com dolo ou culpa. Nesse caso, se o locutor for economicamente hipossuficiente, deverá a DP atuar na defesa dele.
Certa. |
Errada. |
Errada.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS A PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO.
04/05/2014 por caiodireito
STJ, 4ª Turma, REsp 1258389, j. 17/12/2013: A pessoa jurídica de direito público não tem direito à indenização por danos morais relacionados à violação da honra ou da imagem. No atual cenário constitucional, a indagação sobre a aptidão de alguém de sofrer dano moral passa necessariamente pela investigação da possibilidade teórica de titularização de direitos fundamentais. Ocorre que a inspiração imediata da positivação de direitos fundamentais resulta precipuamente da necessidade de proteção da esfera individual da pessoa humana contra ataques tradicionalmente praticados pelo Estado. Em razão disso, de modo geral, a doutrina e jurisprudência nacionais só têm reconhecido às pessoas jurídicas de direito público direitos fundamentais de caráter processual ou relacionados à proteção constitucional da autonomia, prerrogativas ou competência de entidades e órgãos públicos, ou seja, direitos oponíveis ao próprio Estado, e não ao particular. Com efeito, o reconhecimento de direitos fundamentais – ou faculdades análogas a eles – a pessoas jurídicas de direito público não pode jamais conduzir à subversão da própria essência desses direitos, que é o feixe de faculdades e garantias exercitáveis principalmente contra o Estado, sob pena de confusão ou de paradoxo consistente em ter, na mesma pessoa, idêntica posição jurídica de titular ativo e passivo, de credor e, a um só tempo, devedor de direitos fundamentais. Finalmente, cumpre dizer que não socorrem os entes de direito público os próprios fundamentos utilizados pela jurisprudência do STJ e pela doutrina para sufragar o dano moral da pessoa jurídica. Nesse contexto, registre-se que a Súmula 227 do STJ (“A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”) constitui solução pragmática à recomposição de danos de ordem material de difícil liquidação. Trata-se de resguardar a credibilidade mercadológica ou a reputação negocial da empresa, que poderiam ser paulatinamente fragmentadas por violações de sua imagem, o que, ao fim, conduziria a uma perda pecuniária na atividade empresarial. Porém, esse cenário não se verifica no caso de suposta violação da imagem ou da honra de pessoa jurídica de direito público.
Comentários:
Optei por reproduzir um trecho maior do que foi veiculado no Informativo (534) a fim de que se compreenda melhor os fundamentos utilizados pelo STJ para negar à pessoa jurídica de direito público o direito à indenização por danos morais. O caso concreto: o Município de João Pessoa/PB pretendia ser indenizado pelos danos morais que afirma ter sofrido a partir de opiniões transmitidas por uma Rádio. Trata-se, ao que parece, do leading case na matéria, isto é, o primeiro precedente no qual o tema foi efetivamente abordado, sendo que, até então, somente se registravam decisões acerca de direitos fundamentais de índole processual conferidos às pessoas jurídicas de direito público, a exemplo da possibilidade de impetração das ações constitucionais cabíveis para a sua proteção (cf., nesse ponto, na jurisprudência do STF: MS 21239 e MI 725).
Veja-se, ainda, os seguintes trechos de doutrina encontrados no voto do Min. Luis Felipe Salomão (relator do REsp em questão):
Questão bem mais controversa diz com a atribuição de titularidade às pessoas jurídicas de direito público, visto que, em regra, consideradas destinatárias da vinculação dos direitos fundamentais, na condição de sujeitos passivos da obrigação de tutela e promoção dos direitos fundamentais, de tal sorte que, em termos gerais, as pessoas jurídicas de direito público têm tido recusada a condição de titulares de direitos fundamentais. Todavia, considerando, especialmente quando se trata de um Estado Democrático de Direito […], não há como deixar de reconhecer às pessoas jurídicas de direito público, evidentemente consideradas as peculiaridades do caso, a titularidade de determinados direitos fundamentais.
Com efeito, a exemplo do que tem sido reconhecido no âmbito do direito comparado, onde o tema tem alcançado certa relevância, também no direito constitucional brasileiro é possível identificar algumas hipóteses atribuindo a titularidade de direitos fundamentais às pessoas jurídicas de direito público, o que se verifica especialmente na esfera dos direitos de cunho processual (como o direito de ser ouvido em juízo, o direito à igualdade de armas – este já consagrado pelo STF – e o direito à ampla defesa) (SARLET, Ingo Wolfgang [et. al.]. Curso de direito constitucional. 2 ed. (Ingo Wolfgang Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni, Daniel Mitidiero). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 324).
Parece ainda mais contundente o argumento de que a titularidade jusfundamental pelo poder público leva à subversão da própria ideia de direitos fundamentais, desenvolvida a partir da esfera privada e em face do Estado e de suas instrumentalidades. Os direitos fundamentais não são mera técnica jurídica de tutela constitucional de pretensões subjetivas, mas institutos constitucionais de proteção de indivíduos e grupos sociais contra formas de opressão ou de desrespeito à dignidade humana, promovidas pelo Estado ou por poderes civis. Pode-se bem dizer que uma entidade pública é titular do mandado de segurança ou do devido processo legal como instrumentos assegurados pela legislação infraconstitucional, não como garantia fundamental. Ou, pelo menos, não como extensão da titularidade jusfundamental, mas como produto de uma proteção reflexa extraída das normas de direitos.
Assim também, dizemos que certos órgãos públicos detêm poderes ou competências constitucionais que podem ser defendidas em juízo. São direitos públicos subjetivos, como vimos, mas aceitamos que venham a ser identificados como garantias institucionais ou interesses legítimos, como desejam alguns, que estarão sempre relacionados a prerrogativas ou a direitos constitucionais não fundamentais. Em qualquer das modalidades de compreensão, direitos, garantias ou interesses, serão titulares de uma posição jurídica para defesa constitucional e administrativa de sua autonomia e competências, tendo à disposição o recurso à Justiça. […] Mais importante é o seu fundamento: por mais que se critique o viés liberal da leitura dos direitos fundamentais que nega a titularidade das pessoas jurídicas de direito público, não se pode deixar de reconhecer que a inspiração da esfera de autonomia privada, seja como expressão de individualidade ou da dignidade humana, seja, mais correto, como poder de ação intersubjetiva, livre de opressão, é a pedra de toque que confere identidade ao sistema de direitos fundamentais (SAMPAIO, José Adércio Leite. Teoria da Constituição e dos Direitos Fundamentais, p. 639-640).
A Min. Maria Isabel Gallotti acompanhou o Min. relator, mas ressalvou que, noutra ocasião, com outro tipo de panorama de fato, poderia adotar conclusão diversa, ou seja, no sentido de a pessoa jurídica de direito público titularizar o direito fundamental à honra e – eventualmente – ser indenizada por prejuízos sofridos.
Disponivel em <http://oprocesso.com/2014/05/04/indenizacao-por-danos-morais-a-pessoa-juridica-de-direito-publico/>
Copyright © Tecnolegis - 2010 - 2024 - Todos os direitos reservados.