Texto 1
A lealdade conjugal é uma qualidade admirável, além de algo rara. Mas, em um caso, ao menos, ela quase pôs a perder aquela que se tornaria a ideia mais influente do pensamento científico nos dois últimos séculos: a teoria da evolução formulada por Charles Darwin. Casado com sua prima-irmã Emma, o naturalista protelou durante anos a publicação de seu tratado revolucionário, A Origem das Espécies, e quase perdeu de vez a saúde já habitualmente instável com a aflição provocada pelo dilema de editá-lo ou não. A causa primordial de sua angústia era a religiosidade de sua mulher, e a maneira como, em um período particularmente difícil da vida do casal, ela fez aflorar ainda mais dúvidas sobre a fé cristã em que ele fora educado, e da qual abdicara. Desde muito antes de seu casamento, em 1839, Emma e Charles tratavam com franqueza das divergências que poderiam dividi-los. Pianista talentosa, que chegou a ter carreira como concertista, ela era uma entusiasta das ambições do marido e muito colaborou para que se concretizasse sua longa viagem a bordo do navio Beagle, durante a qual ele estabeleceu as bases de sua teoria. Mas Emma tinha também convicções religiosas profundas. A correspondência dos dois nos anos anteriores ao casamento mostra que Darwin nunca escondeu dela sua migra- ção rumo ao agnosticismo. E, durante a maior parte de sua vida conjugal, os dois negociaram, quase sem atrito, suas diferenças. Na década de 1850, porém, uma constelação de fatores abalou essa détente. Em 1851, aos 10 anos, morreu Annie, a filha mais velha e querida de Darwin. O naturalista foi acometido de diversos males – em maior quantidade e gravidade do que fora comum até ali – e tornou-se um quase recluso. Emma se refugiou na fé. Em meio a esse equilíbrio tão precário, Darwin escrevia, escrevia, e não chegava a lugar nenhum: sua teoria (que afinal seria publicada em 1859) de certa forma “assassinava Deus”, e poderia também, portanto, assassinar de mil maneiras diferentes o que restava de harmonia na família, no casamento e no seu íntimo. Darwin, assim como outros grandes pioneiros da ciência, viveu na carne e nos nervos a urgência de seguir adiante e o tormento de consciência de não saber o que esse adiante aguardava.
Texto e frases das questões adaptados de: BOSCOV, Isabela. A teoria e a prática. Veja. São Paulo: Editora Abril, p. 128, ed. 2156, ano 43, n. 11, 17 mar. 2010.
Considere as seguintes afirmativas.
1. Na primeira frase do Texto 1, "A lealdade conjugal é uma qualidade admirável, além de algo rara.", a palavra sublinhada é um pronome indefinido, significando "alguma coisa".
2. A expressão "Annie, a filha mais velha e querida de Darwin" é um exemplo de ambiguidade, pois admite interpretações alternativas como "Annie era a filha mais velha e também aquela que Darwin mais amava" e "Annie era a filha mais velha e uma filha que Darwin amava muito".
3. Se na frase "Darwin escrevia, escrevia, e não chegava a lugar nenhum." a expressão sublinhada fosse substituída por "a lugar algum", a frase estaria gramaticalmente correta, segundo a gramática normativa.
4. No último parágrafo do Texto 1, a expressão "viveu na carne e nos nervos" está empregada em sentido conotativo, isto é, associa-se à ideia de "experimentar fisicamente uma sensação".
Assinale a alternativa que indica todas as afirmativas corretas:
a)
São corretas apenas as afirmativas 2 e 3. |
b)
São corretas apenas as afirmativas 2 e 4. |
c)
São corretas apenas as afirmativas 1, 2 e 3. |
d)
São corretas apenas as afirmativas 1, 3 e 4. |
e)
São corretas apenas as afirmativas 2, 3 e 4. |
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