Há muita senhora que se refere a sua empregada doméstica como “minha auxiliar”. Evita a secura da palavra “empregada” por lhe parecer pejorativa ou politicamente incorreta. As mais sofisticadas chegam a se valer de “minha assistente” ou, ainda, “minha secretária” − em que ganham, por tabela, o status de executiva ou diretora de departamento. Mas fiquemos com “auxiliar”, e pensemos: auxiliar exatamente em qual tarefa? Pois são muitos os casos em que a dona de casa não faz absolutamente nada, a não ser administrar aquilo em que sua “auxiliar” está de fato se empenhando: preparando o almoço, lavando e guardando a louça, limpando a casa, lavando e passando a roupa de toda a família etc.
É muito comum a situação de alguém pegar no batente, fazer todo o serviço pesado e ser identificado como “auxiliar”, ou “estagiário”, ou “assistente”, quando não tachado de “provisório” ou “experimental”. Não se trata de uma implicância com certas palavras; trata-se de reconhecer a condição injusta de quem faz o essencial como se cuidasse apenas do acessório. Lembro-me de que, no meu segundo ano de escola, a professora adoeceu no meio ano. Durante todo o segundo semestre foi substituída por uma jovem, que era identificada como “a substituta”. “Você está gostando da substituta?”. “Será que a substituta vai dar muita lição?”. Ela dava aulas tão bem ou melhor do que a primeira professora, mas não era reconhecida como mestra: estava condenada a ser “a substituta”.
Tais situações nos fazem pensar no reconhecimento que deixa de ser prestado a quem mais fez por merecer. Quando o freguês satisfeito elogia o proprietário de um restaurante pela ótima refeição, não estará se esquecendo de alguém? Valeume, a propósito, a lição de um amigo, quando, depois de um almoço num restaurante, comentei: “Boa cozinha!”. Ao que ele retrucou: “Bom cozinheiro!”. E será que esse cozinheiro tinha um bom “auxiliar”?
(Manuel Praxedes de Sá, inédito)
No 1.º parágrafo, ao se referir às diferentes designações de que se vale muita senhora para se referir à empregada doméstica, o autor mostra que:
a)
o serviço executado pelas "auxiliares" é inferior ao prestado pelas "assistentes" ou pelas "secretárias". |
b)
termos como "auxiliar" ou "assistente", por vezes, não indicam com exatidão as funções efetivamente desempenhadas. |
c)
as palavras utilizadas pelas patroas enfatizam o lado pejorativo ou mesmo humilhante dos trabalhos que descrevem. |
d)
a variação dos tratamentos retrata uma rigorosa hierarquia dos serviços domésticos efetivamente prestados. |
e)
tais palavras e tratamentos indicam que as donas de casa querem fazer justiça à importância da função de quem as serve. |
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