Depois de um bom século de psicologia e psiquiatria dinâmicas, estamos certos disto: o moralizador e o homem moral são figuras diferentes, se não opostas. O homem moral se impõe padrões de conduta e tenta respeitá-los; o moralizador quer impor ferozmente aos outros os padrões que ele não consegue respeitar. A distinção entre ambos tem alguns corolários relevantes. Primeiro, o moralizador é um homem moral falido: se soubesse respeitar o padrão moral que ele impõe, ele não precisaria punir suas imperfeições nos outros. Segundo, é possível e compreensível que um homem moral tenha um espírito missionário: ele pode agir para levar os outros a adotar um padrão parecido com o seu. Mas a imposição forçada de um padrão moral não é nunca o ato de um homem moral, é sempre o ato de um moralizador. Em geral, as sociedades em que as normas morais ganham força de lei (os Estados confessionais, por exemplo) não são regradas por uma moral comum, nem pelas aspirações de poucos e escolhidos homens exemplares, mas por moralizadores que tentam remir suas próprias falhas morais pela brutalidade do controle que eles exercem sobre os outros. A pior barbárie do mundo é isto: um mundo em que todos pagam pelos pecados de hipócritas que não se agüentam.
(Contardo Calligaris, Folha de S. Paulo, 20/03/2008)
No contexto do primeiro parágrafo, a afirmação de que já decorreu um bom século de psicologia e psiquiatria dinâmicas indica um fator determinante para que:
a)
concluamos que o homem moderno já não dispõe de rigorosos padrões morais para avaliar sua conduta. |
b)
consideremos cada vez mais difícil a discriminação entre o homem moral e o homem moralizador. |
c)
reconheçamos como bastante remota a possibilidade de se caracterizar um homem moralizador. |
d)
identifiquemos divergências profundas entre o comportamento de um homem moral e o de um moralizador. |
e)
divisemos as contradições internas que costumam ocorrer nas atitudes tomadas pelo homem moral. |
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