Leia o texto abaixo para responder as questões 1, 2, 3, e 4:
Para Quem Quer Aprender a Gostar
Talvez seja tão simples, tolo e natural que você nunca tenha parado para pensar: aprenda a fazer bonito o seu
amor. Ou fazer o seu amor ser ou ficar bonito. Aprenda, apenas, a tão difícil arte deamar bonito. Gostar é tão fácil
que ninguém aceita aprender.
Tenho visto muito amor por aí. Amores mesmo, bravios, gigantescos, descomunais, profundos, sinceros, cheios de
entrega, doação e dádiva. Mas esbarram na dificuldade de se tornar bonitos. Apenas isso: bonitos, belos ou
embelezados, tratados com carinho, cuidado e atenção. Amores levados com arte e ternura de mãos jardineiras.
Aí esses amores que são verdadeiros, eternos e descomunais de repente se percebem ameaçados apenas e tãosomente
porque não sabem ser bonitos: cobram, exigem; rotinizam; descuidam; reclamam; deixam de
compreender; necessitam mais do que oferecem; precisam mais do que atendem; enchem-se de razões. Sim, de
razões. Ter razão é o maior perigo do amor. Quem tem razão sempre se sente no direito (e o tem) de reinvindicar,
de exigir justiça, eqüidade, equiparação, sem atinar que o que está sem razão talvez passe por um momento de
sua vida no qual não possa Ter razão. Nem queira. Ter razão é um perigo: em geral enfeia o amor, pois é invocado
com justiça, mas na hora errada. Amar bonito é saber a hora de Ter razão.
Ponha a mão na consciência. Você tem certeza de que está fazendo o seu amor bonito? De que está tirando do
gesto, da ação, da reação, do olhar, da saudade, da alegria, do encontro, da dor do desencontro a maior beleza
possível? Talvez não. Cheio ou cheia de razões, você espera do amor apenas aquilo que é exigido por suas partes
necessitadas, quando talvez dele devesse pouco esperar, para valorizar melhor tudo de bom que de vez em
quando ele pode trazer. Quem espera mais do que isso sofre, e sofrendo deixa de amar bonito. Sofrendo, deixa de
ser alegre, igual, irmão, criança. E sem soltar a criança, nenhum amor é bonito.
Não tema o romantismo. Derrube as cercas da opinião alheia. Faça coroas de margaridas e enfeite a cabeça de
quem você ama. Saia cantando e olhe alegre.
Recomendam-se: encabulamentos, ser pego em flagrante gostando; não se cansar de olhar, e olhar; não
atrapalhar a convivência com teorizações; adiar sempre, se possível com beijos, 'aquela conversa importante que
precisamos ter'; arquivar, se possível, as reclamações pela pouca atenção recebida. Para quem ama, toda
atenção é sempre pouca. Quem ama feio não sabe que pouca atenção poder ser toda a atenção possível. Quem
ama bonito não gasta o tempo dessa atenção cobrando a que deixou de Ter.
Não teorize sobre o amor (deixe isso para nós, pobres escritores que vemos a vida como a criança de nariz
encostado na vitrina cheia de brinquedos dos nossos sonhos); não teorize sobre o amor; ame. Siga o destino dos
sentimentos aqui e agora.
Não tenha medo exatamente de tudo o que você teme, como: a sinceridade; não dar certo; depois vir a sofrer
(sofrerá de qualquer jeito); abrir o coração; contar a verdade do tamanho do amor que sente.
Jogue por alto todas as jogadas, estratagemas, golpes, espertezas, atitudes sabidamente eficazes (não é sábio
ser sabido): seja apenas você no auge de sua emoção e carência, exatamente aquele você que a vida impede de
ser. Seja você cantando desafinado, mas todas as manhãs. Falando besteiras, mas criando sempre. Gaguejando
flores. Sentindo o coração bater como no tempo do Natal infantil. Revivendo os carinhos que intuiu em criança.
Sem medo de dizer eu quero, eu gosto, eu estou com vontade.
Talvez aí você consiga fazer o seu amor bonito, ou fazer bonito o seu amor, ou bonitar fazendo o seu amor, ou
amar fazendo o seu amor bonito (a ordem das frases não altera o produto), sempre que ele seja a mais verdadeira
expressão de tudo o que você é, e nunca: deixaram, conseguiu, soube, pôde, foi possível, ser.
Se o amor existe, seu conteúdo já é manifesto. Não se preocupe mais com ele e suas definições. Cuide agora da
forma. Cuide da voz. Cuide da fala. Cuide do cuidado. Cuide do carinho. Cuide de você. Ame-se o suficiente para
ser capaz de gostar do amor e só assim poder começar a tentar fazer o outro feliz."
Texto Retirado do Livro de Crônicas de Artur da Távola : "Alguém que já não fui" - página 149º
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