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Comentários / Câmara Municipal de Santana de Parnaíba - SP (Câmara Municipal de Santana de Parnaíba) - Analista Técnico - Advogado - Instituto Mais (Instituto Mais) - 2016


Texto I

Caso de recenseamento
Carlos Drummond de Andrade

  O agente do recenseamento vai bater numa casa de subúrbio longínquo, aonde nunca chegam as notícias.
  ? Não quero comprar nada.
  ? Eu não vim vender, minha senhora. Estou fazendo o censo da população e lhe peço o favor de me ajudar.
  ? Ah moço, não estou em condições de ajudar ninguém. Tomara eu que Deus me ajude. Com licença, sim?
  E fecha-lhe a porta.
  Ele bate de novo.
  ? O senhor, outra vez?! Não lhe disse que não adianta me pedir auxílio?
  ? A senhora não me entendeu bem, desculpe. Desejo que me auxilie, mas é a encher este papel. Não vai pagar nada, não vou lhe tomar nada. Basta respondera umas perguntinhas.
  ? Não vou respondera perguntinha nenhuma, estou muito ocupada, até logo!
  A porta é fechada de novo, de novo o agente obstinado tenta restabelecer o diálogo.
  ? Sabe de uma coisa? Dê o fora depressa antes que eu chame meu marido!
  ? Chame sim, minha senhora, eu me explico com ele.
  (Só Deus sabe o que irá acontecer. Mas o rapaz tem uma ideia na cabeça: é preciso preencher o questionário, é preciso preencher o questionário, é preciso preencher o questionário).
  ? Que é que há? ? resmunga o marido, sonolento, descalço e sem camisa, puxado pela mulher.
  ? E esse camelô aí que não quer deixar a gente sossegada! 
  ? Não sou camelô, meu amigo, sou agente do censo.
  ? Agente coisa nenhuma, eles inventam uma besteira qualquer, depois empurram a mercadoria! A gente não pode comprar mais nada este mês, Ediraldo! '
  O marido faz-lhe um gesto para calar-se, enquanto ele estuda o rapaz, suas intenções. O agente explica-lhe tudo com calma, convertce-q de que não é nem camelô nem policial nem cobrador de impostos nem enviado de Tenório Cavalcanti. A ideia , de recenseamento, pouco a pouco, vai se instalando naquela casa, penetrando naquele espírito. Não custa atender ao rapaz, que é bonzinho e respeitoso.
  E como não há despesa nem ameaça de despesa ou incômodo de qualquer ordem, começa a informar, obscuramente orgulhoso de ser objeto, pela primeira vez na vida, da curiosidade do governo.    ? O senhor tem filhos, seu Ediraldo?
  ? Tenho três, sim senhor.
  ? Pode me dizer a graça deles, por obséquio? Com a idade de cada um?
  ? Pois não. Tenho o Jorge Independente, de 14 anos; o Miguel Urubatã, de 10; e a Pipoca, de 4.
  ? Muito bem, me deixe tomar nota. Jorge... Urubatã... E a Pipoca, como é mesmo o nome dela?
  ? Nós chamamos ela de Pipoca porque é doida por pipoca.
  ? Se pudesse me dizer como é que ela foi registrada...
  ? Isso eu não sei, não me lembro.
  E, voltando-se para a cozinha:
  ? Mulher, sabes o nome da Pipoca?
  A mulher aparece confusa.
  ? Assim de cabeça eu não guardei. Procura o papel na gaveta.
  Reviram a gaveta, não acham a certidão de registro civil.
  ? Só perguntando à madrinha dela, que foi quem inventou o nome. Pra nós ela é Pipoca, tá bom?
  ? Pois então fica se chamando Pipoca, decide o agente. Muito obrigado, seu Ediraldo, muito obrigado, minha senhora, disponham!

Questão:

Na frase: — O senhor, outra vez?!, a senhora que atende o pesquisador, demonstra

Resposta errada
a) admiração com a presença do rapaz, pois ele se deslocou de longe para visitá-la.
Resposta correta
b) irritação, pois ele acabou de bater à porta e retorna novamente para incomodá-la.
Resposta errada
c) dúvida, uma vez que os sinais de interrogação e exclamação demonstram esse sentimento.
Resposta errada
d) desconfiança, pois o moço estava sendo muito insistente em querer informações sobre a família.

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