1. Os mitólogos costumam chamar de imagens de
mundo certas estruturas simbólicas pelas quais, em todas
as épocas, as diferentes sociedades humanas fundamentaram,
tanto coletiva quanto individualmente, a experiência
5. do existir. Ao longo da história, essas constelações de
idéias foram geradas quer pelas tradições étnicas, locais,
de cada povo, quer pelos grandes sistemas religiosos. No
Ocidente, contudo, desde os últimos três séculos uma
outra prática de pensamento veio se acrescentar a estes
10. modos tradicionais na função de elaborar as bases de
nossas experiências concretas de vida: a ciência. Com
efeito, a partir da revolução científica do Renascimento as
ciências naturais passaram a contribuir de modo cada vez
mais decisivo para a formulação das categorias que a
15. cultura ocidental empregará para compreender a realidade
e agir sobre ela.
Mas os saberes científicos têm uma característica
inescapável: os enunciados que produzem são necessariamente
provisórios, estão sempre sujeitos à superação e à
20. renovação. Outros exercícios do espírito humano, como a
cogitação filosófica, a inspiração poética ou a exaltação
mística poderão talvez aspirar a pronunciar verdades
últimas; as ciências só podem pretender formular verdades
transitórias, sempre inacabadas. Ernesto Sábato assinala
25. com precisão que todas as vezes que se pretendeu elevar
um enunciado científico à condição de dogma, de verdade
final e cabal, um pouco mais à frente a própria
continuidade da aplicação do método científico invariavelmente
acabou por demonstrar que tal dogma não passava
30. senão... de um equívoco. Não há exemplo melhor deste
tipo de superstição que o estatuto da noção de raça no
nazismo.
(Luiz Alberto Oliveira. “Valores deslizantes: esboço de um ensaio
sobre técnica e poder”, In O avesso da liberdade. Adauto
Novaes (Org). São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 191)
No parágrafo 2:
a)
a conjunção Mas (linha 17) foi empregada não para eliminar o que foi dito anteriormente, e, sim, para introduzir uma contrapartida do objeto, fruto de distinta perspectiva de análise. |
b)
constrói-se uma relativização das conquistas da ciência, sustentada na crítica de que ela se vale de procedimentos pouco objetivos na busca da verdade. |
c)
constata-se o caráter incontrolável das experiências científicas, implicitamente atribuído às condições de descontinuidade em que se realizam. |
d)
a expressão necessariamente provisórios (linhas 18 e 19) compõe uma advertência, dirigida a filósofos, poetas e místicos, que desconsideram a objetividade na produção do saber. |
e)
incentiva-se a luta do ser para a constante superação de suas fragilidades pessoais, advindas de sua humana condição e permanente sujeição ao erro. |
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