Texto II
1 É moda dizer que o socialismo fracassou devido
2 à natureza humana. Será? Se você quiser entender o
3 socialismo, poderá ler a História da riqueza do homem,
4 de Leo Huberman. Marx, Engels etc. já exigem mais
5 disposição, mas se você quer MESMO entender como
6 o socialismo dá certo, abandone a teoria e olhe à volta.
7 O que vê? Capitalismo por toda parte? Engano seu...
8 há um enclave socialista, diria até comunista, sólido,
9 consolidado, bem abaixo de nossos narizes e essa
10 obra, revolucionária, foi criada por um francês de nome
11 curtíssimo: Bic.
12 Ele é o inventor da caneta Bic. Não há nada mais
13 comunista do que a caneta Bic. Quer ver? Se você não
14 for encarregado do almoxarifado da empresa, for apenas 15 um homem comum, responda: quantas Bics você
16 comprou na vida? Quantas você já usou? Quantas usou
17 DO COMEÇO ATÉ O FIM?
18 Nas respostas está o segredo. Normalmente (a
19 não ser que seja almoxarife ou tarado), você não
20 comprou nem 5% das Bics que usou em sua vida. E elas
21 vêm e vão mas não pertencem a ninguém em particular.
22 São socializadas e ninguém se desespera ao ver
23 que sua Bic sumiu (experimente perder uma Parker),
24 pois tem certeza de que, em meia hora, outra estará
25 caindo em suas mãos. Você vai ao banco, preenche
26 um cheque, pede emprestada a Bic e a põe no bolso,
27 saindo lépido e fagueiro para esquecê-la com seu
28 colega de trabalho que a pediu "emprestada", mas
29 recupera, logo adiante, outra, esquecida sobre a
30 mesa...
31 As Bics se encaixam perfeitamente na máxima
32 marxista: "De cada um, segundo as suas possibilidades, 33 a cada um, segundo suas necessidades."
34 Quem pode (o almoxar i fe, por exemplo) compra
35 muitas; quem precisa serve-se de acordo com a
36 necessidade e todos ficam felizes.
37 Há maníacos pela propriedade que colocam
38 tiras de papel no interior da caneta com seu nome.
39 Só funciona - às vezes - se conhecermos o dono.
40 Do contrário, olharemos para a caneta em nosso
41 bolso e nos perguntaremos, lendo a tira de papel:
42 "Quem, diabos, é Zwinglio Kelezogulu?"
43 Depois, balançando a cabeça, embolsaremos a
44 caneta. Sem culpa. Eu não disse?
UTZERI, Fritz. Dancing Brasil. Rio
de Janeiro: Record, 2001, p. 145.
Na crônica, alguns sinais de pontuação são muito expressivos, como o emprego de aspas e parênteses. O emprego do sinal de pontuação está corretamente justificado em:
(Questão anulada)
a)
"(a não ser que seja almoxarife ou tarado)" (L. 18-19) - exemplificação de algo anteriormente registrado. |
b)
"(experimente perder uma Parker)" (L. 23) - explicação de algo posteriormente anunciado. |
c)
"emprestada" (L. 26) - marcação de que a palavra não está no seu sentido real. |
d)
"(o almoxarife, por exemplo)" (L. 33) - acréscimo de uma informação para ilustrar o que será dito. |
e)
"'Quem, diabos, é Zwinglio Kelezogulu?'" (L. 41-42) - indicação de ironia presente no discurso. |
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