1 A virada da Era Bush para os Anos Obama marca também a troca de guarda de duas palavras no vocabulário-emocional do norte-americano médio. Sai o “mais” (more), entra o “suficiente” (enough). Ter o 5 suficiente, como ensinam o ativista progressista Michael Moore em seu mais novo documentário e o autor e teórico financeiro John Bogle em seu livro mais recente, é anátema do capitalismo selvagem que se instalou nos EUA nas últimas décadas. Quando há o suficiente, não 10 é preciso mais. Se a sanha gastadora do gringo fez desse o maior país do mundo, movimentando 70% da economia local e, com isso, as engrenagens do resto do planeta, foi essa mesma sanha que levou os Estados Unidos ao 15 chão e, com ele, o planeta. Um exemplo dessa mentalidade é o que disse o então prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani, logo após o ataque às Torres Gêmeas. Indagado sobre o conselho que daria aos seus concidadãos, respondeu: “Gastem”. 20 Gastem. Foi o que os novaiorquinos e o resto do país fizeram. De 2001 até 2008, a dívida média no cartão de crédito de um lar norte-americano triplicou. “Nada nunca é suficiente no atual sistema”, disse Michael Moore no Festival de Cinema de Toronto, em 25 2009. OK, o diretor estava promovendo seu filme, “Capitalismo, uma história de amor” − ele explicou o título dizendo que a história de amor é dos capitalistas com o nosso dinheiro −, e Moore é aquele que fez 30 filmes-denúncia sobre o excesso de armas, os motivos que levaram à Guerra do Iraque etc. Mas, e John Bogle? Ele, que criou um dos maiores fundos de investimentos do mundo, em seu livro “Enough”, defende que o “homo americanus” gasta 35 muito e cria pouco. Estima que um terço do dinheiro que circulou nos EUA em 2007 não tinha base em nada, eram papéis de banco criados por financistas inteligentes. É nesse lago de perdularismo imaginário que os americanos nadaram até se afogar.
(Adaptado de Sérgio Dávila. “Frugalistas” Graças a Deus. Serafina, revista da Folha de S. Paulo, setembro, 2009,
p. 20)
Sempre levado em conta o contexto, é legítimo afirmar que o raciocínio desenvolvido a partir da correlação entre OK, o diretor ... e Mas, e John Bogle, no penúltimo e último parágrafos:
a)
traz implícita a ideia de que as críticas feitas ao capitalismo por Moore, ativista progressista, podem até ser consideradas tendenciosas, mas, no que se refere a John Bogle, teórico financeiro, nada haveria para desmerecer-lhe o crédito. |
b)
revela a convicção de Sérgio Dávila de que tanto o diretor de cinema quanto o autor de obras de prestígio têm de ter suas crenças igualmente respeitadas, dado o conhecido histórico de aversão ao capitalismo que ambos compartilham. |
c)
deixa entrever que os propósitos das declarações de Moore e de Bogle estão mascarados e que, consideradas as intenções subentendidas, ambos merecem restrição, pelo fato de rejeitarem de modo igualmente enérgico a cultura norte-americana. |
d)
torna patente que, ao defender suas crenças, tanto Moore quanto Bogle perdem-se em fabulações, o que acabou por comprometer a compreensão do norte-americano médio acerca da vida econômica, fazendo-o imergir em perigoso pântano imaginário. |
e)
explora o paralelismo entre a perspectiva eminentemente artística e a exclusivamente científica para demonstrar como visões em nada convergentes podem esclarecer as contradições do capitalismo financeiro mundial. |
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