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Comentários / Empresa de Pesquisa Energética - EPE - Analista de Gestão Corporativa - Tecnologia da Informação - CESGRANRIO - 2010 - Prova Objetiva


Futuro Tecnológico

1 Olho para o monitor à minha frente e lembro como,
2 faz tão pouco tempo, eu estaria diante de uma pilha
3 de laudas em branco, ajeitando pelo menos duas
4 delas na máquina de escrever com uma folha de
5 papel-carbono ensanduichada entre elas. Os erros
6 eram apagados com uma sucessão de xis e as emendas
7 feitas laboriosamente a caneta, resultando disso
8 um texto imundo e desfavoravelmente comparável a
9 um papiro deteriorado. Dicionário era na base do
10 levantamento de peso e da lupa de leitura e descobrir
11 se o nome de um sujeito era com q ou com k às vezes
12 demandava até pesquisa telefônica. E, depois de
13 escrever a matéria, ainda se tinha de enfiá-la num
14 malote e rezar para que chegasse a tempo.
15 Hoje acho que teria dificuldade em encontrar
16 papel-carbono para comprar, a juventude nem sabe o
17 que é máquina de escrever, os dicionários, enciclopé-
18 dias e até papiros deteriorados estão a um par de
19 cliques de distância e tudo, de textos a ilustrações, se
20 manda por via eletrônica. Claro, ninguém ou quase
21 ninguém tem saudade dos velhos tempos trabalhosos, até                                                 22 porque não adianta e quem não gostar pode
23 descer do bonde. E minha situação não é diferente,
24 mas de vez em quando fico pensando em certos progressos                                               25 e cá me ocorrem algumas dúvidas .
26 Uma das vantagens atuais em que mais se fala é
27 a possibilidade de trabalhar em casa que agora muita
28 gente tem, em vez de se engravatar, pegar transporte
29 ou se estressar de carro e comparecer a um escritório
30 todos os dias. Há cada vez mais felizardos que
31 trabalham de bermuda, sem camisa e até à beira de uma
32 piscina, almoçam comidinha caseira e econômica,
33 estão na vida que pediram a Deus. Mas acho que, se,
34 em certos casos, isso é verdade, em outros nem tanto,                                                     35 pelo menos a longo prazo. Será que é melhor mesmo não                                                 36 conviver mais com colegas, não participar do
37 bom e do educativamente chato que a convivência
38 diária do trabalho enseja? Será que podemos mesmo
39 dispensar, sem grande prejuízo, as amizades feitas
40 assim, a experiência e o conhecimento que assim nos
41 adviriam? E, se essa prática dá certo no trabalho, por
42 que não dará na escola? Os estudantes teriam aulas
43 pela Internet, com diversas vantagens sobre o sistema                                                       44 atual, dispendioso e cheio de riscos, ocasionados
45 até mesmo pela convivência com colegas violentos ou
inconvenientes.
46 Não tenho tanta certeza dessas vantagens, como
47 acho que pelo menos alguns de vocês também não
48 têm. Sei de gente que dedica todas as suas horas vagas                                                 49 à Internet, no sem-número de grupos de que se
50 pode participar. Assim mesmo, não sobra tempo para
51 responder à enxurrada diária de e-mails e mensagens
52 variadas. O contato pessoal direto, já ameaçado pelo
53 medo que temos de sair (embora também tenhamos
54 medo de ficar em casa, a vida é dura), se torna, para a
55 turma mais radical, um risco desnecessário, uma coisa                                                       56 até meio passée, quando dispomos de recursos
57 como os programas de conversa e as webcams. Tudo
58 muito certo, tudo muito bom, mas me incluo no time
59 dos que acham que, nesse passo, vamos nos resignar de                                               60 vez a viver em tocas e morder, se por acaso
61 toparmos inesperadamente um semelhante. Esse progresso                                           62para mim é retrocesso.
63 Assim como, do ponto de vista do leitor, tenho
64 certeza de que encontrarei companheiros de ideal, em
65 relação a esse negócio de máquina de ler livros, dos
66 quais aquele em que mais se fala é o já famoso Kindle.
67 Para quem não gosta de livros e apenas os usa porque
68 precisa e não pode evitar, com certeza terá utilidade.                                                     69Para quem tem necessidade de ler notícias
70 apressadamente, também. E, enfim, quebrará o galho
71 de uma porção de gente, em áreas que nem podem
72 ser previstas agora.
73 Mas, para quem gosta de ler como eu e vocês (se
74 não gostassem, não estariam lendo isto aqui, achariam
75 coisa melhor para fazer sem muita dificuldade), as
76 trapizongas que estão criando para se ler já chegam
77 causando perplexidade por uma razão elementar, que
78 não pode deixar de ter ocorrido a quem quer que haja
79 pensado um pouquinho sobre o assunto. Antes dessa
80 tremenda invenção, qualquer um podia pegar um livro
81 e lê-lo, tendo como equipamento indispensável no má-
82 ximo, uns óculos. De agora em diante, se a moda pegar,                                                   83 isso acabará sendo inviável. Escapa-me à compreensão o                                                   84 progresso contido num livro que requer um
85 aparelho - e não tão baratinho assim - para ser lido,
86 quando hoje não se precisa de nada, basta saber ler.
87 (...) Quanto ao trabalho, principalmente mental,
88 que o livro dá ao leitor, pergunta-se: a idéia não era
89 essa? Com certeza não chegarei até lá, mas antevejo
90 o dia em que o livro impresso será apresentado como
91 a última novidade.

João Ubaldo Ribeiro, in O Globo

 

 

Questão:

“Os erros eram apagados com uma sucessão de xis e as emendas feitas laboriosamente a caneta, resultando disso um texto imundo...” (L. 5-8). Reescrevendo o trecho, mantendo-se a correção gramatical e o mesmo sentido, tem-se:

Resposta errada
a)

Uma sucessão de xis apagou os erros e a caneta fez as emendas laboriosamente; o resultado foi um texto imundo.

Resposta errada
b)

Xis sucessivos apagavam os erros e a caneta laboriosamente fazia as emendas, as quais tinham como resultado um texto imundo.

Resposta errada
c)

Eu apaguei os erros com uma sucessão de xis e, com a caneta, fiz as emendas laboriosamente, para conseguir no final um texto imundo.

Resposta errada
d)

Apagava-se os erros com xis sucessivos e fazia-se laboriosamente as emendas, onde resultava um texto imundo.

Resposta correta
e)

Apagavam-se os erros com uma sucessão de xis e faziam-se emendas laboriosamente a caneta, o que resultava num texto imundo.

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