Por mais que se queira deixar de lado o tema, não se consegue. O agravamento quase diário dos "eventos climáticos extremos" e o impasse na área das negociações internacionais exigem que se volte à questão.
Vive-se um momento crítico, às vésperas de mais uma reunião preparatória da próxima assembleia da Convenção do Clima, programada para dezembro, no México. Cientistas de 27 países, que durante 15 meses se revezaram em expedições ao Ártico, informam que as previsões pessimistas para degelo até 2100 podem acontecer entre 2013 e 2030. A Organização Meteorológica Mundial avalia que os furacões, até o fim do século, serão menos frequentes, porém mais intensos. E o Sul- Sudeste e o Centro-Oeste brasileiros continuam às voltas com inundações, deslizamentos e mortes.
Mesmo com tudo isso, não se consegue avançar nas negociações. As comunicações feitas até o fim de janeiro à Convenção pelos países sobre suas metas (não compromissos) de redução de emissões deixam claro que não se chegará à redução global mínima para impedir que a temperatura planetária suba mais do que 2 graus, o que terá consequências muito graves. O embaixador chinês na Convenção, Yu Qingtai, já de- clarou que não será possível superar, este ano, as divergências entre os países industrializados, a China e os demais membros do bloco de emergentes (Índia, Brasil, África do Sul), juntando-se à opinião do secretário-geral da Convenção, Yvo de Bôer, que, para complicar ainda mais as coisas, anunciou que em julho renunciará ao cargo e que não vê possibilidade de acordo antes de dois anos.
Talvez a chave possa estar nas mãos do Brasil. Em 1997, quando se negociou o Protocolo de Kyoto, o Brasil apre- sentou proposta de que a contribuição de cada país para a redução de emissões deveria tomar por base suas emissões históricas e as emissões atuais. Considerados os dois números, verifica-se a que porcentagem dos gases poluentes acumulados na atmosfera (onde permanecem séculos) essas cifras corres- pondem. Em seguida calcula-se em quanto as emissões totais de um país respondem pelo aumento da temperatura planetária. Esse número deverá ser transformado na porcentagem das emissões globais que caberá a cada país reduzir.
Essa proposta brasileira foi aprovada, em princípio, com a recomendação de ser submetida a estudos mais aprofun- dados. Mas nada aconteceu desde então. Pode ser, porém, o único caminho justo que leve todos os países a um acordo, porque cada um responderá pelo que fez e faz, proporcional- mente ao todo. E se poderá escapar ao poço sem fundo da discussão entre países industrializados e os demais.
(Washington Novaes. O Estado de S. Paulo, A2 Espaço Aberto, 5 de março de 2010, com adaptações)
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