1 Nenhuma figura é tão fascinante quanto o Falso
Entendido. É o cara que não sabe nada de nada, mas sabe
o jargão. E passa por autoridade no assunto. Um
4 refinamento ainda maior da espécie é o tipo que não sabe
nem o jargão. Mas inventa.
— Ó Matias, você, que entende de mercado de
7 capitais...
— Nem tanto, nem tanto...
(Uma das características do Falso Entendido é
10 a falsa modéstia.)
- Você, no momento, aconselharia que tipo de
aplicação?
13 - Bom. Depende do yield pretendido, do
throwback e do ciclo refratário. Na faixa de papéis top
market - ou o que nós chamamos de topi-marque —, o
16 throwback recai sobre o repasse e não sobre o release,
entende?
- Francamente, não.
19 Aí o Falso Entendido sorri com tristeza e abre
os braços como quem diz: “É difícil conversar com
leigos...”.
22 Uma variação do Falso Entendido é o sujeito
que sempre parece saber mais do que ele pode dizer. A
conversa é sobre política, os boatos cruzam os ares, mas
25 ele mantém um discreto silêncio. Até que alguém pede a
sua opinião e ele pensa muito antes de se decidir a
responder:
28 - Há muito mais coisa por trás disso do que
vocês pensam...
Ou então, e esta é mortal:
31 - Não é tão simples assim...
Faz-se aquele silêncio que precede as grandes
revelações, mas o falso informado não diz nada. Fica
34 subentendido que ele está protegendo as suas fontes em
Brasília.
E há o Falso que interpreta. Para ele, tudo o que
37 acontece deve ser posto na perspectiva de vastas
transformações históricas que só ele está sacando.
- O avanço do socialismo na Europa ocorre
40 em proporção direta ao declínio no uso de gordura
animal nos países do Mercado Comum. Só não vê quem
não quer.
43 E, se alguém quer mais detalhes sobre a sua
insólita teoria, ele vê a pergunta como manifestação de
uma hostilidade bastante significativa a interpretações
46 não ortodoxas, e passa a interpretar os motivos de quem
o questiona, invocando a Igreja medieval, os grandes
hereges da história, e vocês sabiam que toda a Reforma
49 se explica a partir da prisão de ventre de Lutero?
Luis Fernando Verissimo. As mentiras que os homens
contam. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000 (com adaptações).
Com base no texto, assinale a opção correta:
(Questão anulada)
a)
A supressão do “se” em “antes de se decidir a responder” (L.26-27) preservaria a correção gramatical e o significado do período. |
b)
No trecho “Há muito mais coisa por trás disso” (L.28), se a palavra “coisa” estivesse no plural e o verbo haver estivesse no pretérito imperfeito, seria necessário reescrevê-lo da seguinte forma: Haviam muito mais coisas por trás disso. |
c)
Caso o autor do texto tivesse usado o ponto final no lugar das reticências em “— Não é tão simples assim...” (L.31), o efeito conseguido seria diferente do criado por estas. |
d)
O “falso informado” (L.33) é um subtipo ou uma variação do “Falso Entendido” (L.1-2). |
e)
Seria mais adequado ao texto substituir a expressão “sacando” (L.38) por um sinônimo como esperando. |
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