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Comentários / TSE - Tribunal Superior Eleitoral - Analista Judiciário - CONSULPLAN - 2012 - Genérica 2 (11 a 15 - Jud. - 16 a 20) (Genérica)


Texto I


01        A tradição teológica e filosófica nunca conseguiu
          explicar o “mistério da iniquidade”, a existência do mal
          como potência do desejo e da ação humanas.
          Ora, a corrupção é o mal do nosso tempo.
05        Curiosamente, ela aparece como uma nova regra de
          conduta, uma contraditória “moral imoral”. Da
          governalidade aos atos cotidianos, o mundo da vida no
          qual ética e moral se cindiram há muito tempo
          transformou-se na sempre saqueável terra de ninguém.
10        Como toda moral, a corrupção é rígida. Daí a
          impossibilidade do seu combate por meios comuns, seja
          o direito, seja a polícia. Do contrário, meio mundo
          estaria na prisão. A mesma polícia que combate o
          narcotráfico nas favelas das grandes cidades poderia
15        ocupar o Congresso e outros espaços do governo onde
          a corrupção é a regra.
          Mas o problema é que a força da corrupção é a do
          costume, é a da “moral”, aquela mesma do malandro
          que age “na moral”, que é “cheio de moral”. Ela é muito
20        mais forte do que a delicada reflexão ética que
          envolveria a autonomia de cada sujeito agente. E que só
          surgiria pela educação política que buscasse um
          pensamento reflexivo.
          O sistema da corrupção é composto de um jogo de
25        forças do qual uma das mais importantes é a “força do
          sentido”. É ela que faz perguntar, por exemplo, “como é
          possível que um policial pobre se negue a aceitar
          dinheiro para agir ilegalmente?”
          O simples fato de que essa pergunta seja colocada
30        implica o pressuposto de que uma verdade ética tal
          como a honestidade foi transvalorada. Isso significa que
          foi também desvalorizada.
          Se a conduta de praxe seria não apenas aceitar,
          mas exigir dinheiro em troca de uma ação qualquer na
35        contramão do dever, é porque no sistema da corrupção
          o valor da honestidade, que garantiria ao sujeito a sua
          autonomia, foi substituído pela vantagem do dinheiro.
          Mas não somente. Aquele que age na direção da lei
          como que age contra a moral caracterizada pelo “fazer
40        como a grande maioria”, levando em conta que no
          âmbito da corrupção se entende que o que a maioria
          quer é “dinheiro”.
          Verdade é que a ação em nome de um universal
          por si só caracteriza qualquer moral. É por meio dela
45        que se faz o cálculo do “sentido” no qual, fora da
          vantagem que define a regra, o sujeito honesto se
          transfigura imediatamente em otário.
          Se a moral é medida em dinheiro, não entregar-se a
          ele poderá parecer um luxo. Mas um contraditório luxo
50        de pobre, já que a questão da honestidade não se
          coloca para os ricos, para quem tal valor parece de
          antemão assegurado.
          Daí que jamais se louve nos noticiários a
          honestidade de alguém que não se enquadra no
55        estereótipo do “pobre”. Honesto é sempre o pobre
          elevado a cidadão exótico. Na verdade, por meio desse
          gesto o pobre é colocado à prova pelo sistema. Afinal
          ele teria tudo para ser corrupto, ou seja, teria todo o
          motivo para sê-lo. Mas teria também todo o perdão?
60        O cidadão exótico – pobre e honesto – que deixa de
          agir na direção de uma vantagem pessoal como que
          estaria perdoado por antecipação ao agir imoralmente
          sendo pobre, mas não está. A frase de Brecht seria sua
          jurisprudência mais básica: “O que é roubar um banco
65        comparado a fundar um?”
          Ora, sabemos que essa “moral imoral” tem sempre
          dois pesos e duas medidas, diferentes para ricos e
          pobres. No vão que as separa vem à tona a
          incompreensibilidade diante do mistério da
70        honestidade. De categoria ética, ela desce ao posto de
          irrespondível problema metafísico.
          Pois quem terá hoje a coragem de perguntar como
          alguém se torna o que é quando a subjetividade, a
          individualidade e a biografia já não valem nada e
75        sentimos apenas o miasma que exala da vala comum
          das celebridades da qual o cidadão pode se salvar
          apenas alcançando o posto de um herói exótico,
          máscara do otário da vez?

(Marcia Tiburi. Cult, dezembro de 2011)

Questão:

Assinale a palavra que, no texto, NÃO exerça papel pronominal.

Resolução da Equipe Tecnolegis:

A Banca justifica a manutenção do gabarito, ao examinar recurso em relação a esta questão, da seguinte maneira:

“Se a conduta de praxe seria não apenas aceitar, mas exigir dinheiro em troca de uma ação qualquer na...” “qualquer” usado depois de um substantivo, com artigo indefinido, antes deste, adquire valor adjetival pejorativo.

“...o mundo da vida no qual ética e moral se cindiram há muito tempo...” “muito”, neste caso, exerce função pronominal já que: trata-se de pronome indefinido antecedendo o substantivo, expressa quantidade e/ou qualidade indefinidas. “há muito tempo” denota que a quantidade de tempo está indefinida. Para que “muito” exerça” função adverbial de intensidade deverá ser determinante de adjetivo significando extremamente ou exageradamente ( muito rico, muito pobre), determinante do verbo significando excessivamente, demais ( bebeu muito, doeu muito) ou determinante de outro advérbio ( muito cedo, muito perto), o que não ocorre no trecho destacado.

“A mesma polícia que combate o narcotráfico nas favelas das grandes cidades poderia ocupar o Congresso e outros espaços do governo onde a corrupção é a regra.” “onde” pode exercer a função de advérbio interrogativo de lugar. Pode aparecer tanto nas orações interrogativas diretas quanto nas indiretas, o que não é o caso. No período em destaque, o pronome “onde” se relaciona com o termo antecedente “o Congresso e outros espaços do governo”.“Onde” é empregado como pronome relativo, aquele que se relaciona com um termo antecedente, dando início a uma oração, chamada adjetiva.

Fontes: DICIONÁRIO HOUAISS DA LÍNGUA PORTUGUES. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009. P. 1327, 1584.

SACCONI, Luiz Antonio. Nossa Gramática, Teoria e Prática. São Paulo: Atual, 1994. p. 183, 253.

Resposta errada
a)

onde (L. 15)

Resposta errada
b)

muito (L. 8)

Resposta correta
c)

qualquer (L. 34)

Resposta errada
d)

outros (L. 15)

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