"Nenhum homem é uma ilha", escreveu o inglês John Donne em 1624, frase que atravessaria os séculos como um dos lugares-comuns mais citados de todos os tempos. Todo lugar-comum, porém, tem um alicerce na realidade ou nos sentimentos humanos – e esse não é exceção. Durante toda a história da espécie, a biologia e a cultura conspiraram juntas para que a vida humana adquirisse exatamente esse contorno, o de um continente, um relevo que se espraia, abraça e se interliga. A vida moderna, porém, alterou-o de maneira drástica. Em certos aspectos partiu o continente humano em um arquipélago tão fragmentado que uma pessoa pode se sentir totalmente separada das demais. Vencer tal distância e se reunir aos outros, entretanto, é um dos nossos instintos básicos. E é a ele que atende um setor do mercado editorial que cresce a passos largos: o da autoajuda e, em particular, de uma autoajuda que se pode descrever como espiritual. Não porque tenha necessariamente tonalidades religiosas (embora elas, às vezes, sejam nítidas), mas porque se dirige àquelas questões de alma que sempre atormentam os homens. Como a perda de uma pessoa querida, a rejeição ou o abandono, a dificuldade de conviver com os próprios defeitos e os alheios, o medo da velhice e da morte, conflitos com os pais e os filhos, a frustração com as aspirações que não se realizaram, a perplexidade diante do fim e a dúvida sobre o propósito da existência. Questões que, como séculos de filosofia já explicitaram, nem sempre têm solução clara – mas que são suportáveis quando se tem com quem dividir seu peso, e esmagadoras quando se está só. As mudanças que conduziram a isso não são poucas nem sutis: na sua segunda metade, em particular, o século XX foi pródigo em abalos de natureza social que reconfiguraram o modo como vivemos. O campo, com suas relações próximas, foi trocado em massa pelas cidades, onde vigora o anonimato. As mulheres saíram de casa para o trabalho, e a instituição da "comadre" virtualmente desapareceu. Desmanchou-se também a ligação quase compulsória que se tinha com a religião, as famílias encolheram drasticamente não só em número de filhos mas também em sua extensão. A vida profissional se tornou terrivelmente competitiva, o que acrescenta ansiedade e reduz as chances de fazer amizades verdadeiras no local de trabalho. Também o celular e o computador fazem sua parte, aumentando o número de contatos de que se desfruta, mas reduzindo sua profundidade e qualidade. Perdeu-se aquela vasta rede de segurança que, é certo, originava fofoca e intromissão, mas também implicava conselhos e experiência, valores sólidos e afeição desprendida, que não aumenta nem diminui em função do sucesso ou da beleza. Essa é a lacuna da vida moderna que a autoajuda vem se propondo a preencher: esse sentido de desconexão que faz com que em certas ocasiões cada um se sinta como uma ilha desgarrada do continente e sem meios de se reunir novamente a ele.
(Isabela Boscov e Silvia Rogar. Veja, 2 de dezembro de 2009, pp. 141–143, com adaptações)
A afirmativa inicial do texto significa, em outras palavras, que:
a)
o fato de uma pessoa se manter isolada das demais é um dos aspectos inerentes à natureza humana. |
b)
todos os homens podem usufruir, por decisão própria, situações de afastamento dos demais, à semelhança de uma ilha. |
c)
o sentimento coletivo transforma os homens num aglomerado de ilhas, como num arquipélago. |
d)
o isolamento entre os homens pode fazer parte de sua natureza, embora eles vivam em sociedade. |
e)
os homens são dependentes uns dos outros por natureza, distintos das ilhas, que são isoladas por definição. |
De acordo com o texto:
a)
as mudanças sociais ocorridas no século XX alteraram o modo de vida das pessoas, permitindo maior aproximação entre elas. |
b)
a transformação de um mundo rural em uma sociedade urbana favoreceu o surgimento de uma rede de contatos pessoais mais próximos. |
c)
a ausência de um verdadeiro sentimento religioso induz as pessoas a uma insatisfação que marca até mesmo as relações de trabalho na sociedade moderna. |
d)
a beleza e o sucesso pessoal passaram a ser mais importantes na vida moderna, em detrimento das relações de verdadeira e desinteressada afeição. |
e)
a vida moderna instituiu novos padrões e valores que regem a sociedade, aproximando os homens em torno de serviços oferecidos pelas cidades. |
Considerando-se o 2.º parágrafo, está INCORRETO o que se afirma em:
a)
O parágrafo se articula com o por meio de uma ressalva, expressa por porém. |
b)
O segmento grifado em partiu o continente humano pode ser substituído por partiu-lhe. |
c)
Há relação de causa e consequência no segmento um arquipélago tão fragmentado que uma pessoa pode se sentir totalmente separada das demais. |
d)
Há nele enumeração de situações que exemplificam as questões de alma que sempre atormentam os homens. |
e)
Substituindo-se o segmento grifado em quando se está só por estamos, a palavra só deverá ir obrigatoriamente para o plural - sós. |
A expressão cujo sentido está corretamente transcrito, com outras palavras, é:
a)
um alicerce na realidade = uma base na existência efetiva. |
b)
alterou-o de maneira drástica = substituiu-o paulatinamente. |
c)
um arquipélago tão fragmentado = ilhas de relevo acidentado. |
d)
foi pródigo em abalos de natureza social = permitiu algumas alterações na sociedade. |
e)
a ligação quase compulsória = uma convicção extrema. |
As mudanças que conduziram a isso não são poucas nem sutis... ( 3.º parágrafo)
A expressão grifada refere-se, corretamente:
a)
às condições impostas tanto pela biologia quanto pela cultura ao modo de vida que se desenhou nos dias de hoje. |
b)
ao crescimento de um tipo de literatura que se difundiu pelo mundo todo, como alternativa à perda do antigo sentimento religioso. |
c)
à retomada do espírito de união que sempre caracterizou os agrupamentos humanos, com a consciência de que cada um é parte de um todo social. |
d)
às questões existenciais que se agravaram diante da percepção de isolamento existente nas contingências da vida moderna. |
e)
à certeza de que frases que se tornam repetitivas ao longo do tempo constituem a base da autoajuda, tão importante nos dias de hoje. |
E é a ele que atende um setor do mercado editorial que cresce a passos largos... ( 2.º parágrafo)
O pronome grifado substitui corretamente, considerando- se o contexto:
a)
um arquipélago fragmentado |
b)
um relevo que se espraia. |
c)
um dos nossos instintos básicos. |
d)
um dos lugares-comuns mais citados de todos os tempos. |
e)
um setor de autoajuda do mercado editorial. |
Todo lugar-comum, porém, tem um alicerce na realidade ou nos sentimentos humanos ... (1º parágrafo)
A frase cujo verbo exige o mesmo tipo de complemento que o grifado é:
a)
... é um dos nossos instintos básicos. |
b)
.... que cresce a passos largos ... |
c)
... que conduziram a isso ... |
d)
... as famílias encolheram drasticamente ... |
e)
... que acrescenta ansiedade ... |
Considere as seguintes afirmativas, a respeito do emprego de sinais de pontuação no texto:
I. O emprego das aspas que isolam a 1.ª frase e a palavra "comadre" no 3.º parágrafo tem o mesmo sentido em ambos os casos.
II. Os travessões que se encontram no 1.º e no final do 2.º parágrafo podem ser corretamente substituídos por vírgulas, sem alteração do sentido original.
III. O emprego dos dois-pontos no 2.º e no final do último parágrafo sinaliza a introdução de segmentos que especificam a afirmativa imediatamente anterior a eles.
IV. O segmento isolado por parênteses no 2.º parágrafo apresenta sentido contraditório no contexto, podendo ser inteiramente descartado, sem prejuízo do sentido textual.
Está correto o que se afirma APENAS em:
a)
III e IV. |
b)
II e III. |
c)
II e IV. |
d)
I e III. |
e)
I e II. |
... que faz com que em certas ocasiões ... (último parágrafo)
A lacuna que deverá ser corretamente preenchida pela expressão grifada está em:
a)
O mercado editorial de autoajuda, ...... abrange várias categorias, cresce a olhos vistos em todo o mundo. |
b)
O conteúdo dos livros de autoajuda, ...... os leitores acreditam, serve de inspiração para o sucesso na vida e na carreira profissional. |
c)
Os leitores estão convictos ...... essas publicações serão a inspiração para uma vida mais harmônica e feliz. |
d)
Os livros de autoajuda procuram conduzir as pessoas a obterem com tenacidade tudo aquilo ...... so nham. |
e)
A literatura de autoajuda constitui, no momento, os meios ...... as pessoas recorrem para viver melhor. |
Orientação espiritual ...... todas as pessoas é um dos propósitos ...... que escritores e pensadores vêm se dedicando, porque a perplexidade e a dúvida são inevitáveis ...... condição humana.
As lacunas da frase estarão corretamente preenchidas, respectivamente, por:
a)
à - a - à |
b)
à - à - a |
c)
a - a - à |
d)
a - à - à |
e)
a - a - a |
Copyright © Tecnolegis - 2010 - 2024 - Todos os direitos reservados.