De todos os persistentes horrores brasileiros, o pior,
talvez porque represente tantas coisas ao mesmo tempo, é o
horror do sistema penitenciário. Ele persiste há tanto tempo
porque, no fundo, é o retrato do que a elite brasileira pensa do
povo, e portanto nunca chega a ser um horror exatamente
insuportável. Pois se fica cada vez mais infernal, apesar de
todas as boas intenções de reformá-lo, é infernal para bandidos,
que afinal merecem o castigo.
A cadeia brasileira é um resumo cruel da nossa resignação
à fatalidade social. Pobre não deixará de ser pobre, e
a ideia da reabilitação, em vez do martírio exemplar do apenado,
por mais que seja proclamada como uma utopia a ser
buscada quando sobrar dinheiro, é a negação desse fatalismo
histórico. É uma ideia bonita, mas não é da nossa índole. Ou da
índole da nossa elite.
É impossível a gente (que vive aqui em cima, onde tem
ar) imaginar o que seja essa subcivilização que se criou dentro
dos presídios brasileiros, onde as pessoas vivem e morrem
pelas leis ferozes de uma sociedade selvagem − mas leis e
sociedade assim mesmo.
O que está sendo representado por essa selvageria tão
desafiadoramente organizada? Que lá dentro o país é igual ao
que é aqui fora, menos os disfarces e a hipocrisia, e que tudo
não passa de uma paródia sangrenta para nos dar vergonha?
Ou que eles são, finalmente, a classe animal sem redenção
possível que o país passou quinhentos anos formando, fez o
favor de reunir numa superlotação só para torná-la ainda mais
desumana e que agora o aterroriza?
Como sempre, a lição dos fatos variará de acordo com a
conveniência de cada intérprete. As rebeliões reforçam a resignação,
provando que bandido não tem jeito mesmo ou só
matando, ou condenam o fatalismo que deixou a coisa chegar a
esse ponto assustador. De qualquer jeito, soluções só quando
sobrar algum dinheiro.
(Adaptado de Luis Fernando Verissimo, O mundo é bárbaro)
A relação insistentemente estabelecida entre o conceito de fatalismo e a realidade do sistema penitenciário brasileiro está caracterizada de modo conciso nesta frase:
a)
A cadeia brasileira é um resumo cruel da nossa resignação à fatalidade social. |
b)
(...) é infernal para bandidos, que afinal merecem o castigo. |
c)
É uma ideia bonita, mas não é da nossa índole. |
d)
O que está sendo representado por essa selvageria tão desafiadoramente organizada? |
e)
É impossível a gente (...) imaginar o que seja essa subcivilização que se criou dentro dos presídios (...). |
Atente para as seguintes afirmações:
I. O autor entende que a elite brasileira, ao considerar que os prisioneiros são efetivamente merecedores dos horrores do sistema penitenciário, naturaliza e justifica essa situação.
II. A situação surpreendente dos atuais presídios é um alerta para todos aqueles que vêm garantindo tão significativas conquistas no terreno da reabilitação social.
III. O autor considera a hipótese de que a realidade interna dos presídios seja vista como uma réplica desmascarada das violências que ocorrem na sociedade brasileira.
Em relação ao texto, está correto SOMENTE o que se afirma em
a)
I. |
b)
II. |
c)
III. |
d)
I e II. |
e)
I e III. |
Afirmações como Pobre não deixará de ser pobre e eles são a classe animal sem redenção possível ilustram adequadamente
a)
a convicção daqueles que não acreditam que nossas camadas populares revelem alguma índole especial. |
b)
os valores viciosos de uma ideologia ultraconservadora, com a qual se identifica a elite brasileira. |
c)
a certeza de que qualquer solução para os horrores do nosso sistema penitenciário requererá vultosos investimentos. |
d)
o fato de que todas as rebeliões de presos, independentemente de suas causas, repercutem do mesmo modo na sociedade. |
e)
a expectativa, considerada pela elite, de que só com altos custos se daria fim aos horrores do nosso sistema penitenciário. |
Estão plenamente observadas as normas de concordância verbal na frase:
a)
Dentro da elite nunca se criticou, diante da rotina do sistema penitenciário brasileiro, os horrores a que os presos são submetidos. |
b)
Reserva-se ao pobre, tantas vezes identificado como potencialmente perigoso, as opções da resignação ou da marginalidade social. |
c)
Sem altos investimentos não haverão como minimizar os horrores que vêm caracterizando as nossas penitenciárias. |
d)
A nenhum dos intérpretes de um fato faltarão argumentos para considerá-lo segundo seu interesse e sua conveniência. |
e)
Ainda que não lhes convenham fazer altos investimentos, as elites terão que calcular os custos de tanta violência. |
Está clara e correta a redação deste livre comentário sobre o texto:
a)
O cronista se dispõe a denunciar que nosso sistema penitenciário desfruta de péssimas condições, impondo horrores aos que nele se encontram apenados. |
b)
São ambíguas as reações à eventualidade de uma rebelião, haja visto que esta tanto pode gerar um certo fatalismo como propiciar ceticismo em relação aos bandidos. |
c)
Sugere-se, no texto, que as barbaridades sofridas pelos presos, no sistema penitenciário, lembram as duras discriminações que sofrem os pobres em nossa sociedade. |
d)
Há um fatalismo que predomina em nosso modo de ser, revelando uma índole violenta, que as elites sancionam quando lhes convêm, ou fazem vista grossa, quando é o caso. |
e)
O texto indica que não deixa de ser cômodo, para muitos, acreditar que existe uma natureza humana violenta e irreprimível, contra a qual não vale a pena lutar, mas resignar-se. |
Alguns anos atrás, a palavra "conectividade" dormia em
paz, em desuso, nos dicionários, lembrando vagamente algo
como ligação, conexão. Agora, na era da informática e de todas
as mídias, a palavra pulou para dentro da cena e ninguém mais
admite viver sem estar conectado. Desconfio que seja este o
paradigma dominante dos últimos e dos próximos anos, em
nossa aldeia global: o primado das conexões.
No ônibus de viagem, de que me valho regularmente,
sou quase uma ilha em meio às mais variadas conexões: do vizinho
da direita vaza a chiadeira de um fone de ouvido bastante
ineficaz; do rapazinho à esquerda chega a viva conversa que
mantém há quinze minutos com a mãe, pelo celular; logo à
frente um senhor desliza os dedos no laptop no colo, e se eu
erguer um pouquinho os olhos dou com o vídeo − um filme de
ação − que passa nos quatro monitores estrategicamente posicionados
no ônibus. Celulares tocam e são atendidos regularmente,
as falas se cruzam, e eu nunca mais consegui me distrair
com o lento e mudo crepúsculo, na janela do ônibus.
Não senhor, não são inocentes e efêmeros hábitos
modernos: a conectividade irrestrita veio para ficar e conduzir a
humanidade a não sabemos qual destino. As crianças e os jovens
nem conseguem imaginar um mundo que não seja movido
pela fusão das mídias e surgimento de novos suportes digitais.
Tanta movimentação faz crer que, enfim, os homens estreitaram
de vez os laços da comunicação.
Que nada. Olhe bem para o conectado ao seu lado.
Fixe-se nele sem receio, ele nem reparará que está sendo
observado. Está absorto em sua conexão, no paraíso artificial
onde o som e a imagem valem por si mesmos, linguagens prontas
em que mergulha para uma travessia solitária. A conectividade
é, de longe, o maior disfarce que a solidão humana
encontrou. É disfarce tão eficaz que os próprios disfarçados não
se reconhecem como tais. Emitimos e cruzamos frenéticos sinais
de vida por todo o planeta: seria esse, Dr. Freud, o sintoma
maior de nossas carências permanentes?
(Coriolano Vidal, inédito)
O paradoxo central de que trata o autor dessa crônica está no fato de que
a)
o paradigma da conectividade fez o homem apagar sua maior conquista: uma efetiva comunicação com seus semelhantes. |
b)
as múltiplas mídias contemporâneas exercem tamanha sedução sobre nós que deixamos de ser o que sempre fomos: uns românticos. |
c)
nunca foi tão difícil ficarmos sós, mormente numa época como a nossa, em que a solidão ganhou foros de alto prestígio. |
d)
as múltiplas formas de conectividade, que marcam nosso tempo, surgem como um eficaz mascaramento da humana solidão. |
e)
as pessoas que se rendem a todos os mecanismos de conexão são as que melhor compreendem as razões de suas carências. |
Atente para as seguintes afirmações:
I. No primeiro parágrafo, sugere o autor que a velha palavra "conectividade" ganhou novas conotações, em virtude da multiplicação das mídias e dos novos hábitos sociais.
II. No segundo parágrafo, a experiência de uma viagem de ônibus é nostalgicamente lembrada para se opor ao mundo das comunicações eletrônicas e dos transportes mais rápidos.
III. No último parágrafo, o autor vê nas obsessivas conexões midiáticas e em seus múltiplos suportes um indício de que estamos buscando suprimir nossas carências mais profundas.
Em relação ao texto está correto SOMENTE o que se afirma em
a)
I. |
b)
II. |
c)
III. |
d)
I e II. |
e)
II e III. |
Considerando-se o contexto, está correta a seguinte observação sobre uma expressão ou frase do texto:
a)
em um fone de ouvido bastante ineficaz, o termo sublinhado tem o sentido de desestimulante. |
b)
a conectividade que veio para ficar é qualificada como irrestrita porque ela nada restringe a ninguém. |
c)
o segmento Que nada enfatiza a ideia de que os homens já não se deparam com entraves em sua comunicação. |
d)
com paraíso artificial, o autor quer acentuar o fato de que o prestígio da conectividade não será duradouro. |
e)
ao empregar de longe, o autor intensifica a superioridade da comparação a seguir. |
Está INADEQUADO o emprego do elemento sublinhado na frase:
a)
No ônibus de viagem, ao qual recorro regularmente, sou quase uma ilha em meio às mais variadas conexões. |
b)
Ao contrário de outros tempos, já não é mais ao crepúsculo que me atenho em minhas viagens. |
c)
A conectividade está nos conduzindo a um destino com o qual ninguém se arrisca a prever. |
d)
As pessoas absortas em suas conexões parecem imergir numa espécie de solidão com cujo sentido é difícil de atinar. |
e)
O cronista considera que nossas necessidades permanentes, às quais alude no último parágrafo, disfarçam-se em meio a tantas conexões. |
A conectividade está na ordem do dia, não há quem dispense a conectividade, seja para testar o alcance da conectividade, seja para alçar a conectividade ao patamar dos valores absolutos.
Evitam-se as viciosas repetições do texto acima substituindo-se os elementos sublinhados, na ordem dada, por:
a)
lhe dispense - testá-la o alcance - alçá-la |
b)
a dispense - lhe testar o alcance - alçá-la |
c)
a dispense - a testar no seu alcance - lhe alçar |
d)
dispense-a - testá-la o alcance - alçá-la |
e)
dispense-lhe - lhe testar o alcance - lhe alçar |
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