Tenho uma boa notícia para você, leitor. Agora você já pode acreditar no que eu escrevo, porque, desde o último dia 17, não sou mais um charlatão. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu em caráter definitivo que o diploma de jornalismo não é necessário para o exercício regular da profissão.
Como sói acontecer, todos os ministros do chamado Pretório Excelso presentes à sessão, menos o Marco Aurélio Mello, concordaram que a exigência do canudo violava os princípios constitucionais da liberdade de imprensa e da livre manifestação do pensamento.
Partilho dessa opinião. Não que até o dia 17 o Brasil vivesse sob o signo de Ahmadinejad, num estado de absoluto arbítrio e misericordiosa censura. Mas é forçoso reconhecer um país no qual se dispensam controles para definir quem pode e quem não pode escrever em jornais está mais perto da plenitude liberal democrática. Nunca é demais recordar que o decreto-lei 972/1969, que estabelecia a exigência do diploma, foi baixado pelo governo militar durante os anos de chumbo.
Não é esse, porém, o aspecto do julgamento que eu gostaria de ressaltar. O que me parece ser o ponto central é a questão da liberdade de ofício. O inciso XIII do artigo 5.º da Carta estabelece: "É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer". Um velho provérbio alemão assevera que o diabo se esconde nos detalhes. Em que casos convém que o legislador regulamente uma profissão?
A maioria das pessoas dotadas de justo quinhão de bom senso tende a concordar que o licenciamento só é necessário para ofícios que requeiram um saber técnico bastante preciso, como medicina e engenharia, ou exijam alguma perícia específica, a exemplo de piloto de avião, cuja ausência represente ponderável risco para a população.
Um jornalista até pode divulgar informações falsas que acabam provocando grandes estragos. Mas buscar um conjunto de matérias teóricas que capacitem um estudante a tornar-se um bom repórter ou editor é tarefa fadada ao fracasso. Trocando em miúdos, podemos afirmar que o engenheiro, para fazer com que a ponte fique em pé, precisa ter cursado cálculo I e II e conhecer certas noções de física que podem ser aprendidas nas escolas politécnicas. O médico, para receitar uma droga, precisa saber algo de bioquímica e farmacologia. Mas o que dizer do jornalista? O que ele precisa além de noções de português (em tese obtidas no processo de alfabetização) e de disposição para estudar um pouco o assunto de que vai falar? Talvez, se houvesse as disciplinas verdade I, II, III e IV, reconhecidas pelo MEC... Nunca é demais insistir, ninguém se torna ético só porque assistiu a aulas de ética na faculdade de filosofia. Afirmar, como se faz por aí, que escolas de jornalismo são garantia de bom comportamento moral no exercício da profissão faz tanto sentido quanto dizer que quem vai à missa não comete pecados. (...)
Como lembrou o sempre sensato ministro Celso de Mello, a regra geral deveria ser a liberdade de ofício. Entretanto, ele contou pelo menos cinco projetos de lei que tramitam no Congresso e tratam da regulamentação das profissões de modelo de passarela, designer de interiores, detetives, babás e escritores. Acrescento, por minha conta, as de demonstrador de mercadorias (PL 5451/09), cerimonialista (PL 5425/09), educador social (PL 5346/09), fotógrafo (PL 5187/09), depilador (PL 4771/09). Já resvalando no reino da fantasia, busca-se também regulamentar a ocupação de astrólogo (PL 6748/02) e terapeuta naturista (PL 2916/92). Pergunto-me como nossos solertes parlamentares puderam se esquecer de regular os ofícios de Papai Noel e das indispensáveis fadas.
Em muitos casos, as propostas são oportunamente esquecidas nos escaninhos do Legislativo (há um lado bom na inoperância do Congresso), mas nem sempre. Categorias mais poderosas como a de médicos e advogados obtiveram o que seria impensável num Estado verdadeiramente republicano. Os discípulos de Esculápio, por exemplo, conseguiram transformar em lei geral o Código de Ética que eles mesmos elaboraram. Já nossos nobres causídicos deram um novo significado à noção de lobby ao inscrever não em lei ordinária, mas na própria Constituição o direito de indicar juízes para praticamente todas as cortes do país e de propor ações diretas de inconstitucionalidade (privilégio reservado a poucos). Pior, cuidaram para que a Lei Maior do país trouxesse um dispositivo que atua como impedimento a que o cidadão represente a si mesmo em juízo – erro lógico que nega o próprio conceito de cidadania.
Gostaria que a extinção da exigência de diploma de jornalista fosse o primeiro passo num movimento mais geral de descorporativização do Estado, mas receio que seja apenas um caso isolado. A mentalidade cartorial-corporativista está bem arraigada na alma do brasileiro. É uma pena. Esse seria um bom momento para mudanças. As divisões clássicas entre as ciências estão ruindo. Faz cada vez menos sentido compartimentalizar o saber – e, consequentemente, o ensino – em ramos pré-definidos como física, química, biologia. A pesquisa de ponta se faz hoje através de casamentos improváveis como aquele entre médicos e matemáticos (medicina baseada em evidências) ou entre economistas e neurocientistas (economia comportamental). A perseverar a inércia patrimonialista, enquanto o mundo estiver produzindo nova e boa ciência, nós por aqui estaremos paralisados: não teremos os especialistas necessários porque eles não saberão se devem contribuir para o conselho de biólogos ou a ordem dos estatísticos.
(Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/helioschwartsman/ult510u585738.shtml) Texto adaptado.
Conforme o 6.º parágrafo do texto, é CORRETO afirmar:
a)
Cursar escolas de jornalismo não é garantia para um comportamento ilibado no exercício da profissão. |
b)
Os jornalistas, ao divulgar maledicências, enfraquecem os danos que podem causar. |
c)
Os engenheiros precisam de conhecimentos altamente técnicos, ensinados somente pelas universidades. |
d)
Buscar um conjunto de matérias teóricas, para capacitar um estudante a se tornar um bom repórter, será um sucesso. |
Tendo em vista os três primeiros parágrafos do texto, marque a alternativa CORRETA:
a)
Antes da decisão do STF, o Brasil vivia num estado de absoluto poderio e misericordiosa censura. |
b)
Foi baixado um decreto-lei, nos anos de repressão, garantindo o direito do livre exercício da profissão de jornalista. |
c)
O autor não pode mais ser considerado um trapaceiro, por causa da decisão, em caráter categórico, do STF. |
d)
Todos os magistrados enjeitaram que o diploma de jornalismo feria os princípios constitucionais da liberdade de imprensa. |
De acordo com o 8.º parágrafo do texto, pode-se afirmar:
a)
A Constituição veda o direito do cidadão representar a si mesmo em juízo. |
b)
Todos os projetos de lei são levados à votação no Legislativo. |
c)
O Código de Ética dos causídicos foi elaborado por eles mesmos. |
d)
Os discípulos do Esculápio inscreveram na Carta Magna o direito de indicar juízes para todas as cortes do Brasil. |
Com referência ao 5.º parágrafo do texto, grande parte das pessoas com bom senso:
a)
Difere que o licenciamento da profissão está fadado ao revés. |
b)
Anui que o licenciamento da profissão requer ressalvas. |
c)
Reconhece que o licenciamento da profissão deve acontecer para todos os ofícios. |
d)
Admite que o licenciamento da profissão é pífio para todas as ocupações. |
Em relação ao 9.º parágrafo do texto, marque a alternativa CORRETA:
a)
Não serão formados novos especialistas porque eles sentir-se-ão irresolutos a que conselho ou ordem devem contribuir. |
b)
A mentalidade cartorial-corporativista é muito efêmera para o brasileiro. |
c)
Com a inércia patrimonialista, os brasileiros produzirão novos e seguros especialistas sobre a que conselho devem amparar. |
d)
A extinção da exigência de diploma de jornalismo é apenas um passo para burocratizar o Estado. |
Leia:
(...) Pergunto-me como nossos solertes parlamentares puderam se esquecer de regular os ofícios de Papai Noel e das indispensáveis fadas. (...)
O vocábulo que substitui adequadamente o que está destacado é:
a)
Inexoráveis. |
b)
Sagazes. |
c)
Rigorosos. |
d)
Inflexíveis. |
As expressões sublinhadas apresentam sua correspondência CORRETA em:
a)
|
b)
|
c)
|
d)
|
Marque a alternativa em que todas as palavras são formadas pelo mesmo tipo de derivação:
a)
Abalo, enfileirar, castigo. |
b)
Alistar, desalmado, empalidecer. |
c)
Jogador, boiada, infelizmente. |
d)
Incapaz, achatamento, refresco. |
Marque a alternativa em que a forma verbal traduza um fato habitual, durativo, no pretérito:
a)
Minha mãe possuía um excelente coração. |
b)
O fim não justifica os meios. |
c)
Se ela não tira o bebê depressa, seria uma tragédia. |
d)
Fora injustiça destituí-lo do cargo. |
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