As leis não podem deixar de ressentir-se da fraqueza dos homens. Elas são variáveis como eles.
Algumas, nas grandes nações, foram ditadas pelos poderosos com o fim de esmagar os fracos. Eram tão equívocas que mil intérpretes se apressaram a comentá-las; e, como a maioria só fez sua glosa como quem executa um ofício para ganhar algum dinheiro, acabou o comentário sendo mais obscuro que o texto. A lei transformou-se numa faca de dois gumes que degola tanto o inocente quanto o culpado. Assim, o que devia ser a salva guarda das nações transformou-se tão amiúde em seu flagelo que alguns chegaram a perguntar se a melhor das legislações não consistiria em não se ter nenhuma.
Examinemos a questão. Se vos moverem um processo de que dependa vossa vida, e se de um lado estiverem as compilações de juristas sabidos e prepotentes, e de outro vos apresentarem vinte juízes pouco eruditos mas que, sendo anciãos isentos das paixões que corrompem o coração, estejam acima das necessidades que o aviltam, dizei-me: por quem escolheríeis ser julgados, por aquela turba de palradores orgulhosos, tão interesseiros quanto ininteligíveis, ou pelos vinte ignorantes respeitáveis?
(VOLTAIRE. O preço da justiça. Trad. Ivone Castilho Benedetti. São Paulo Martins Fontes, 2011. p. 7-8)
O texto permite inferir adequadamente que, para Voltaire, as leis
a)
elaboradas por anciãos ignorantes demandam o corretivo da sabedoria dos especialistas, quando de sua aplicação num julgamento. |
b)
devem ser permanentemente revistas, para que de forma alguma venham a refletir debilidades ou imperfeições que são próprias dos homens. |
c)
elaboradas por déspotas poderosos trazem consigo a qualidade do que é inflexível, não permitindo aberturas interpretativas. |
d)
refletem a falibilidade humana, podendo ser aplicadas com mais justiça pelos sensatos e experientes do que por arrogantes eruditos. |
e)
costumam ser tão obscuras quanto os comentários explicativos, advindo daí a necessidade de serem elaboradas por doutos especialistas. |
Atente para as seguintes afirmações:
I. No primeiro parágrafo, o segmento elas são variáveis expressa uma causa da qual a expressão fraqueza dos homens constitui o efeito.
II. No segundo parágrafo, considera-se que a multiplicidade de interpretações da lei, acionadas por glosadores interesseiros, acaba por comprometer a implementação da justiça.
III. No terceiro parágrafo, a interrogação final de Voltaire pode ser considerada retórica pois implica uma resposta já encaminhada pela pergunta.
Em relação ao texto, está correto APENAS o que se afirma em
a)
II e III. |
b)
I e II. |
c)
III. |
d)
II. |
e)
I. |
Considerando-se o sentido contextualizado, traduz-se adequadamente um segmento em:
a)
turba de palradores orgulhosos (3.º parágrafo) = malta de loquazes desfibrados |
b)
ressentir-se da fraqueza dos homens (1.º parágrafo) = impressionar-se com a insipidez humana |
c)
transformou-se numa faca de dois gumes (2.º parágrafo) = tornou-se um instrumento ambivalente |
d)
transformou-se tão amiúde em seu flagelo (2.º parágrafo) = converteu-se em miudezas punitivas |
e)
compilações de juristas sabidos (3.º parágrafo) = seleções de jurisconsultos leigos |
Está clara e correta a redação deste livre comentário sobre o texto:
a)
Voltaire entendia que as leis, em cuja aplicação traduz-se as fraquezas humanas, dependem do espírito de quem as aplica, de vez que está nisso sua faculdade maior. |
b)
A Voltaire interessava não apenas reconhecer ou esmiuçar as leis de seu tempo, mas sobretudo avaliá-las considerando a instância de sua aplicação, que deveria ser a mais justa possível. |
c)
Esmiuçar ou interpretar as leis eram um empenho de Voltaire, para quem a salvaguarda dos direitos humanos, sobretudo dos mais pobres, deveriam ser invioláveis. |
d)
Para quem se ater ao espírito das leis, segundo Voltaire, é preferível fazer justiça com os leigos ponderados do que deixar-lhe nas mãos de juristas empertigados e autoritários. |
e)
Sendo função das leis regular a distribuição de justiça, Voltaire não admitia que seu espírito venha a sofrer prejuízo em sua concepção, mormente quando mal aplicada. |
O verbo entre parênteses, para vir a integrar adequadamente a frase, deverá flexionar-se concordando com o elemento sublinhado em:
a)
Ao admitir que a ignorância e a respeitabilidade são qualidades que (poder) alcançar conciliação , Voltaire revela seu lado democrático. |
b)
Nunca (ter) faltado a Voltaire, em relação às leis que analisava, disposição para tornar sua aplicação o mais justa possível. |
c)
Não se (atribuir) apenas ao pobre rábula os prejuízos que recaem sobre os mais fracos; também os eruditos sejam responsabilizados. |
d)
Devido à má aplicação das leis, problema que a muitos juristas (parecer) incontornável, houve quem pensasse em aboli-las por completo. |
e)
Voltaire entende que os anciãos, aos quais não (costumar) faltar a experiência dos anos, são mais imunes às paixões que corrompem o coração. |
Para Voltaire, quem se ...... (dispor) a zelar pela justa aplicação das leis, não importando a época em que isso ...... (vir) a ocorrer, ...... (dever), antes de mais nada, considerar a fragilidade daqueles sobre os quais o seu peso ...... (recair).
Para preencherem adequadamente as lacunas da frase acima, os verbos indicados entre parênteses deverão flexionar-se na seguinte sequência:
a)
disponha - viria - deveria - recairia |
b)
disponha - viesse - deveria - recaía |
c)
dispuser - venha - deverá - recairá |
d)
dispuser - virá - deveria - recaia |
e)
dispusesse - vinha - devesse - recaísse |
A História não é uma ciência. É uma ficção. Vou mais longe: assim como ocorre na ficção, há na História uma tentativa de reconstruir a realidade por meio de um processo de seleção de materiais. Os historiadores apresentam uma realidade cronológica, linear, lógica. Mas a verdade é que se trata de uma montagem, fundada sobre um ponto de vista. A História é escrita sob um prisma masculino. A História é escrita na perspectiva dos vencedores. Se fosse feita pelas mulheres ou pelos vencidos, seria outra. Enfim, há uma História dos que têm voz e uma outra, não contada, dos que não a têm. (...)
Que diabo é a verdade histórica? Só algo que foi desenhado, e depois esse desenho estabelecido foi cercado de escuro para que a única imagem que pudesse ser vista fosse a que se quer mostrar como verdade. Nossa tarefa é tirar todo o escuro, saber o que é que ficou sem ser mostrado.
(Adaptado de: SARAMAGO, José. As palavras de Saramago. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 254)
O autor propõe que a História deva se constituir a partir de um empenho coletivo em:
a)
Se fosse feita pelas mulheres (...) seria outra. |
b)
A História é escrita sob um prisma masculino. |
c)
(...) se trata de uma montagem, fundada sobre um ponto de vista. |
d)
(...) há uma História dos que não têm voz. |
e)
Nossa tarefa é tirar todo o escuro. |
Com base no que afirma o texto, deve-se depreender que a História, vista como um discurso produzido por determinados sujeitos,
a)
é uma narrativa que explicita com clareza os mecanismos de poder aos quais a maioria da população está sendo submetida. |
b)
somente traduz o ponto de vista de quem é capaz de reconhecer, porque os sofreu, os processos políticos e sociais mais adversos. |
c)
traduz tão somente o ponto de vista interessado e tendencioso de quem a narra, o que a dota de um caráter eminentemente parcial. |
d)
somente será legítima na medida em que representar a média das opiniões e valores dos indivíduos poderosos que a desenham. |
e)
é uma narrativa destituída de qualquer valor documental, pois a rigor não representa a perspectiva de nenhum dos setores sociais. |
Ao se defrontar com a História, Saramago submete a História a uma rigorosa análise, considerando a História como um discurso, atribuindo à História certo caráter ficcional, que compromete a transparência da História .
Evitam-se as viciosas repetições do texto acima substituindo-se os elementos sublinhados, na ordem dada, por:
a)
submete-lhe - a considerando - atribuindo-a - compromete-lhe a transparência |
b)
submete-a - considerando-a - atribuindo-lhe - lhe compromete a transparência |
c)
lhe submete - considerando-a - atribuindo-lhe - compromete-lhe a transparência |
d)
a submete - considerando-lhe - atribuindo-a - lhe compromete a transparência |
e)
submete-a - a considerando - atribuindo-na - lhe compromete a transparência |
É preciso corrigir, por apresentar irregularidades gramaticais e/ou defeito estrutural, a redação da seguinte frase:
a)
Para que não haja senão um desenho parcial da História, é preciso iluminar aquilo que foi deixado à sombra, e assim surgirá a imagem integral de tudo o que a constituiu. |
b)
Saramago apresenta em seu texto uma visão bastante rigorosa da História, ao considerá-la um discurso que, nada tendo de científico, identifica-se com o da ficção literária. |
c)
O autor do texto deixa claro que a voz das camadas sociais menos prestigiadas jamais se representa no discurso da História, organizado na perspectiva dos vencedores. |
d)
Ao se posicionar diante da História, quando então Saramago julga-a um discurso em cuja carga ficcional se assemelha a ficção, afastando-a assim do estatuto de uma ciência. |
e)
Fossem as mulheres ou os vencidos os encarregados de narrar a História, esta certamente não se apresentaria na perspectiva pela qual a narram os homens e os vencedores. |
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