Sem exceção, homens e mulheres de todas as idades, culturas e níveis de instrução têm emoções, cultivam passatempos que manipulam as emoções, atentam para as emoções dos outros, e em grande medida governam suas vidas buscando uma emoção, a felicidade, e procurando evitar emoções desagradáveis. À primeira vista, não existe nada caracteristicamente humano nas emoções, pois numerosas criaturas não humanas têm emoções em abundância; entretanto, existe algo acentuadamente característico no modo como as emoções vincularam-se a ideias, valores, princípios e juízos complexos que só os seres humanos podem ter. De fato, a emoção humana é desencadeada até mesmo por uma música e por filmes banais cujo poder não devemos subestimar.
Embora a composição e a dinâmica precisas das reações emocionais sejam moldadas em cada indivíduo pelo meio e por um desenvolvimento único, há indícios de que a maioria das reações emocionais, se não todas, resulta de longos ajustes evolutivos. As emoções são parte dos mecanismos biorreguladores com os quais nascemos, visando à sobrevivência. Foi por isso que Darwin conseguiu catalogar as expressões emocionais de tantas espécies e encontrar consistência nessas expressões, e é por isso que em diferentes culturas as emoções são tão facilmente reconhecidas. É bem verdade que as expressões variam, assim como varia a configuração exata dos estímulos que podem induzir uma emoção. Mas o que causa admiração quando se observa o mundo do alto é a semelhança, e não a diferença. Aliás, é essa semelhança que permite que a arte cruze fronteiras.
As emoções podem ser induzidas indiretamente, e o indutor pode bloquear o progresso de uma emoção que já estava presente. O efeito purificador (catártico) que toda boa tragédia deve produzir, segundo Aristóteles, tem por base a suspensão de um estado sistematicamente induzido de medo e compaixão.
Não precisamos ter consciência de uma emoção, com frequência não temos e somos incapazes de controlar intencionalmente as emoções. Você pode perceber-se num estado de tristeza ou de felicidade e ainda assim não ter ideia dos motivos responsáveis por esse estado específico. Uma investigação cuidadosa pode revelar causas possíveis, porém frequentemente não se consegue ter certeza. O acionamento inconsciente de emoções também explica por que não é fácil imitá-las voluntariamente. O sorriso nascido de um prazer genuíno é produto de estruturas cerebrais localizadas em uma região profunda do tronco cerebral. A imitação voluntária feita por quem não é um ator exímio é facilmente detectada como fingimento – alguma coisa sempre falha, quer na configuração dos músculos faciais, quer no tom de voz.
(Adaptado de: DAMÁSIO, Antonio. O mistério da consciência. Trad. Laura Teixeira Motta. São Paulo, Cia das letras, 2015, 2.ed, p. 39-49)
No texto, identifica-se relação de causa e consequência, respectivamente, entre:
a)
processos evolutivos de adaptação que remontam a épocas distantes e grande parte das reações emocionais. |
b)
a suscitação de uma emoção imprevista e a estratégia por trás de uma obra de arte vulgar feita para agradar o público em geral. |
c)
o fato de Darwin ter sido bem-sucedido ao catalogar as expressões emocionais de diversas espécies e a existência de emoções inerentes à regulação dos organismos. |
d)
nossa incapacidade de dissimular as emoções e o fato de que não precisamos ter consciência de uma emoção para que ela aconteça. |
e)
a capacidade da arte de cruzar fronteiras culturais e o fato das reações emocionais serem moldadas por uma composição complexa única e exclusiva a cada indivíduo. |
O acréscimo de uma ou mais vírgulas no segmento original resultou em alteração de sentido em:
I. ... e, em grande medida, governam suas vidas... (1.º parágrafo)
II. ... cultivam passatempos, que manipulam as emoções... (1.º parágrafo)
III. ... porém, frequentemente, não se consegue ter certeza. (último parágrafo)
Atende ao enunciado APENAS o que consta em
a)
II e III. |
b)
I e II. |
c)
II. |
d)
I e III. |
e)
III. |
O segmento grifado adquire sentido de alternância em:
a)
Uma investigação cuidadosa pode revelar causas possíveis, porém frequentemente não se consegue ter certeza. (4.º parágrafo). |
b)
Mas o que causa admiração quando se observa o mundo do alto é a semelhança, e não a diferença. (2.º parágrafo). |
c)
O acionamento inconsciente de emoções também explica por que não é fácil imitá-las... (4.º parágrafo). |
d)
... alguma coisa sempre falha, quer na configuração dos músculos faciais, quer no tom de voz. (4.º parágrafo). |
e)
... a emoção humana é desencadeada até mesmo por uma música e por filmes banais... (1.º parágrafo). |
Considerando-se o segundo parágrafo do texto, é correto afirmar:
a)
O segmento assim como pode ser substituído por "conquanto", sem prejuízo da correção e do sentido. |
b)
Sem prejuízo da correção, a expressão do alto pode ser substituída por "a distância". |
c)
A supressão da crase no segmento visando à sobrevivência, embora correta gramaticalmente, acarreta mudança ao sentido original. |
d)
Caso o verbo "resultar", originalmente flexionado no singular, seja flexionado no plural, haverá prejuízo para a correção. |
e)
Admite transposição para a voz passiva a frase que as expressões variam. |
Ao se reescrever um segmento do texto, o sinal indicativo de crase foi empregado de modo correto em:
a)
Frequentemente não temos consciência de uma emoção, pois somos incapazes de à controlar propositadamente. |
b)
Essa é, à propósito, a semelhança que permite que a arte cruze fronteiras. |
c)
Por sinal, à essa semelhança imputa-se a causa da arte ser capaz de cruzar fronteiras. |
d)
A partir dessa semelhança, permite-se à arte cruzar fronteiras. |
e)
À uma região profunda do tronco cerebral atribui-se o ponto de partida de reações como um sorriso nascido de um prazer genuíno. |
... há indícios de que a maioria das reações emocionais, se não todas... (2.º parágrafo)
Mantendo-se o mesmo tipo de relação que estabelece na frase acima, o segmento sublinhado preenche corretamente a lacuna desta frase:
a)
Todos, ...... você, riram-se do acidente. |
b)
O palestrante não obteve outra coisa ...... escárnio. |
c)
Fala três línguas, ...... quatro. |
d)
Não expressou ...... emoções negativas. |
e)
Havia um ...... em seu exame. |
As normas de concordância estão plenamente respeitadas na redação da seguinte frase:
a)
Ainda que se admita que o aprendizado e a cultura alteram a expressão de uma emoção e conferem-lhe novos significados, constata-se que as emoções dependem de mecanismos cerebrais estabelecidos de modo inato. |
b)
O impacto integral e duradouro dos sentimentos requer a consciência, pois somente com o advento de um sentido do “eu” tornam-se conhecidos os sentimentos pelo indivíduo que os possuem. |
c)
As emoções são adaptações singulares que integram o mecanismo, especialmente das espécies mais desenvolvidas, com os quais os organismos regulam sua sobrevivência. |
d)
Emoções de todas as gradações, como consequência de um poderoso mecanismo de aprendizado de importância vital para a sobrevivência, torna-se inseparável de nossa ideia de bem e de mal. |
e)
Não se pode observar o sentimento que um outro vivencia, mas alguns aspectos da emoção que o originou é perfeitamente observável por outra pessoa. |
Os Beatles eram um mecanismo de criação. A força propulsora desse mecanismo era a interação dialética de John Lennon e Paul McCartney. Dialética é diálogo, embate, discussão. Mas também jogo permanente. Adição e contradição. Movimento e síntese. Dois compositores igualmente geniais, mas com inclinações distintas. Dois líderes cheios de ideias e talento. Um levando o outro a permanentemente se superar.
As narrativas mais comuns da trajetória dos Beatles levam a crer que a parceria Lennon e McCartney aconteceu apenas na fase inicial do conjunto. Trata-se de um engano. Mesmo quando escreviam separados, John e Paul o faziam um para o outro. Pensavam, sentiam e criavam obcecados com a presença (ou ausência) do parceiro e rival.
Lennon era um purista musical, apegado a suas raízes. Quem embarcou na vanguarda musical dos anos 60 foi Paul McCartney, um perfeccionista dado a experimentos e delírios orquestrais. Em contrapartida, sem o olhar crítico de Lennon, sem sua verve, os mais conhecidos padrões de McCartney teriam sofrido perdas poéticas. Lennon sabia reprimir o banal e fomentar o sublime.
Como a dialética é uma via de mão dupla, também o lado suave de Lennon se nutria da presença benfazeja de Paul. Gemas preciosas como Julia têm as impressões digitais do parceiro, embora escritas na mais monástica solidão.
Nietzsche atribui caráter dionisíaco aos impulsos rebeldes, subjetivos, irracionais; forças do transe, que questionam e subvertem a ordem vigente. Em contrapartida, designa como apolíneas as tendências ordenadoras, objetivas, racionais, solares; forças do sonho e da profecia, que promovem e aprimoram o ordenamento do mundo. Ao se unirem, tais forças teriam criado, a seu ver, a mais nobre forma de arte que jamais existiu.
Como criadores, tanto o metódico Paul McCartney como o irrequieto John Lennon expressavam à perfeição a dualidade proposta por Nietzsche. Lennon punha o mundo abaixo; McCartney construía novos monumentos. Lennon abria mentes; McCartney aquecia corações. Lennon trazia vigor e energia; McCartney impunha senso estético e coesão.
Quando os Beatles se separaram, essa magia se rompeu. John e Paul se tornaram compositores com altos e baixos. Fizeram coisas boas. Mas raramente se aproximaram da perfeição alcançada pelo quarteto. Sem a presença instigante de Lennon, Paul começou a patinar em letras anódinas. Não se tornou um compositor ruim. Mas os Beatles faziam melhor.
Ironicamente, o grande disco dos ex-Beatles acabou sendo o álbum triplo em que George Harrison deglutiu os antigos companheiros de banda, abrindo as comportas de sua produção represada durante uma década à sombra de John e Paul. E foi assim, por estranhos caminhos antropofágicos, que a dialética de Lennon e McCartney brilhou pela última vez.
(Adaptado de: DANTAS, Marcelo O. Revista Piauí. Disponível em: http://revistapiaui.estadao.com.br/materia/beatles. Acesso em: 20/02/16)
É correto depreender do texto:
I. O autor apresenta o contraste entre Apolo e Dionísio, estabelecido por Nietzsche, com o propósito de classificar os processos de criação de John Lennon e Paul McCartney à luz de tal teoria, processos que seriam, respectivamente, dionisíaco e apolíneo.
II. Ao lançar mão do termo "dialética" no último parágrafo, o autor assinala a incongruência da atitude dos Beatles ao se separarem, uma vez que tal separação ocasionou a derrocada da criação musical dos membros da banda.
III. O uso do adjetivo "antropofágicos" (último parágrafo) para caracterizar os caminhos seguidos por George Harrison está relacionado à afirmativa anterior de que o músico teria "deglutido" os antigos companheiros de banda.
Atende ao enunciado o que consta APENAS em
a)
I. |
b)
II e III. |
c)
I e II. |
d)
II. |
e)
I e III. |
Considerado o contexto, afirma-se corretamente:
a)
Nos segmentos Mesmo quando escreviam separados, John e Paul o faziam um para o outro (2.º parágrafo) e E foi assim (...) que a dialética de Lennon e McCartney (último parágrafo), ambos os elementos sublinhados são pronomes que exercem a mesma função. |
b)
Substituindo-se "um engano" por "equívocos", o verbo da frase Trata-se de um engano (2° parágrafo) deverá ser flexionado no plural. |
c)
Sem prejuízo da correção, o segmento sublinhado em As narrativas mais comuns da trajetória dos Beatles levam a crer que ... (2.º parágrafo) pode ser substituído por "levam à crença de que". |
d)
Mantendo-se o sentido original, os elementos sublinhados em sem o olhar crítico de Lennon, sem sua verve (3.º parágrafo) e Paul começou a patinar em letras anódinas (7.º parágrafo) podem ser substituídos, respectivamente, por "irreverência" e "perniciosas". |
e)
Expandindo-se a oração embora escritas na mais monástica solidão (4.º parágrafo), o resultado será: "embora cada um deles as tenham escrito na mais monástica solidão". |
... tanto o metódico Paul McCartney como o irrequieto John Lennon expressavam à perfeição a dualidade... (6.º parágrafo)
O verbo que possui, no contexto, o mesmo tipo de complemento que o da frase acima está empregado em:
a)
Os Beatles eram um mecanismo de criação. |
b)
Fizeram coisas boas. |
c)
... a mais nobre forma de arte que jamais existiu. |
d)
... criavam obcecados com a presença (ou ausência)... |
e)
... que a dialética de Lennon e McCartney brilhou pela última vez. |
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